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Cantina escolar: um lugar para promover a alimentação saudável

Pesquisadores do Rio Grande do Sul realizaram projeto que resultou em curso de extensão e livro sobre o tema



Em tempos anteriores à pandemia, a escola costumava ser o local onde as crianças passavam boa parte de seus dias. Por isso, a preocupação por ter opções de alimentação saudável nas cantinas escolares e os problemas decorrentes de hábitos alimentares pouco saudáveis têm pautado discussões e pesquisas nacionais e internacionais. Em seu estudo mais recente, de outubro de 2017, a Organização Mundial de Saúde (OMS) aponta que, no Brasil, 9,4% das meninas e 12,4% dos meninos são considerados obesos, de acordo com os critérios adotados para classificar a obesidade infantil. Segundo a organização, uma pessoa é considerada obesa quando o Índice de Massa Corporal (IMC) está acima de 30. O IMC é resultado de um cálculo que considera peso, altura e idade.

Ações por parte do Estado já foram tomadas em relação ao estabelecimento de regras para a alimentação consciente nos colégios. Uma delas é a Lei nº 15.216, de 30 de julho de 2018, que dispõe sobre a promoção da alimentação saudável e proíbe a comercialização de produtos que colaborem para obesidade, diabetes e hipertensão em cantinas e similares instaladas em escolas públicas e privadas do Rio Grande do Sul.

A partir dessa perspectiva, a professora Vanessa Ramos Kirsten, do curso de Nutrição da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), deu início ao projeto “Cantina Saudável: a gente apoia esta ideia”, proposto como uma atividade de extensão no campus da UFSM em Palmeira das Missões. Segundo a docente, “o objetivo inicial era mapear as cantinas do município, ou seja, quais escolas tinham e quais escolas não tinham cantina. E, entre aquelas que tinham, como eram? O que vendiam?”. O início do projeto coincidiu com a época em que a lei estadual que promovia a alimentação saudável foi criada. 

Além de ser uma atividade de extensão, o projeto também ficou vinculado a uma disciplina de educação alimentar nutricional, no curso de Nutrição do campus. Após o mapeamento feito nas cantinas das escolas em Palmeira das Missões, o foco passou a ser ajudá-las a oferecer opções mais saudáveis aos alunos.

Desenvolvimento do projeto

Em 2016, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico Tecnológico (CNPq) lançou um edital de apoio a projetos relacionados à segurança alimentar. A iniciativa buscava fomentar núcleos e grupos de ensino, pesquisa e extensão com expertise em segurança alimentar e nutricional. O objetivo era apoiar a produção, a humanização, a socialização e a popularização de conhecimento e tecnologias relacionadas ao tema no âmbito da União de Nações Sul-Americanas (Unasul). Além disso, buscava formar e fortalecer uma rede de instituições para o intercâmbio de pesquisadores sobre o tema na América do Sul. Uma das exigências da chamada pública era que o projeto não fosse apenas de pesquisa, mas também de extensão, e que pudesse gerar um curso sobre o tema de pelo menos 160 horas.

O projeto “Cantina Saudável” participou da seleção por meio de uma proposta pensada para o território do Noroeste Colonial – uma região do Rio Grande do Sul que abrange 34 municípios. A ideia era realizar um curso para implementar cantinas saudáveis nas escolas das cidades da região. Para tal, a partir do mapeamento realizado previamente, um diagnóstico mais completo seria feito com as escolas que tinham cantina, levando em consideração aspectos dos alimentos e a higiene dos locais. A iniciativa foi selecionada e ficou entre os primeiros lugares na chamada pública do CNPq.

O desenvolvimento do projeto foi interinstitucional, pois teve parceria com outras instituições gaúchas. Uma delas foi a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS): “A Mariana Balestrin, uma egressa nossa, fazia doutorado lá, em saúde da criança e do adolescente. Então o doutorado dela também faz parte desse projeto”, conta a profesora Vanessa. O curso de Sistemas de Informação, da Universidade de Passo Fundo (UPF), também auxiliou na proposta, através do desenvolvimento de um aplicativo criado para ajudar os pesquisadores na coleta de dados sobre as escolas: “Informações sobre os alimentos comercializados e as condições higiênicas das cantinas foram obtidas”, explica a docente. Posteriormente, tal aplicativo foi patenteado e validado pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial INPI.

Houve também uma parceria com o professor Oscar Agustín Torres Figueredo, do Departamento de Engenharia Florestal do campus de Frederico Westphalen da UFSM. O edital do CNPq exigia um intercâmbio com algum país latinoamericano que, no caso do projeto da UFSM, foi realizado no Paraguai. “O professor Oscar é paraguaio, então nós fizemos um intercâmbio para conhecer as cantinas do seu país de origem”, destaca Vanessa, ressaltando que as características das cantinas foram semelhantes às analisadas no Rio Grande do Sul. Um dos pontos realçados pelos pesquisadores é de que o país não tem políticas públicas muito fortes para a alimentação escolar. 

Após o mapeamento de mais de 300 escolas, feito através de ligações telefônicas, o grupo percebeu que só 8% das escolas tinham cantina. Um número baixo, em virtude de a maioria das cidades da região serem pequenas, de aproximadamente 4 mil habitantes, e com características majoritariamente rurais. O estudo detectou a presença de cantinas em escolas privadas e públicas – porém, em sua maioria, em instituições privadas. “Nós utilizamos como protocolo de coleta dessas informações o manual da cantina saudável, que é do Ministério da Saúde, publicado em 2010”, relata a professora. 

Com o apoio da professora Carla Brasil, do Departamento de Alimentos e Nutrição do campus de Palmeira das Missões, o grupo utilizou um checklist, ou seja, uma lista de checagem validada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), para avaliar as condições das cantinas. A análise concluiu que havia baixa preocupação com os alimentos que eram oferecidos. As poucas escolas que ofereciam alimentos in natura, como sucos e frutas, eram de escolas privadas, mas essas instituições também ofereciam alimentos ultraprocessados. O mais grave, segundo a professora Vanessa, foram questões de risco sanitário: “A maioria das cantinas não tinham nem água potável para higienizar as mãos”. 

Outra etapa do projeto foi a realização de um ensaio clínico. Nele, os responsáveis pelas cantinas que faziam parte do estudo foram separados em dois grupos: um deles faria um curso (que teve de oito a dez semanas de duração) e o outro receberia só o manual. Tal experimento fez parte da pesquisa da doutoranda Mariana Balestrin. Para Vanessa, algo que chamou a atenção nessa fase foi a desconfiança dos proprietários das cantinas: “As pessoas não nos viam como agentes para ajudá-los, as pessoas nos viam como fiscalizadores. Esse é um grande problema que a gente tem nessa área de pesquisa” revela Vanessa.

Alimentação na prática

Para muitas famílias, a venda de alimentos na escola é uma facilidade que garante o lanche das crianças de segunda a sexta-feira, pois muitos pais têm uma jornada de trabalho integral, o que dificulta o preparo do lanche para seu filho levar ao colégio. Segundo Geonice Hauschildt, vice-diretora do colégio Antônio Alves Ramos Pallotti, de Santa Maria, na escola, o estímulo a uma alimentação saudável pode ser estabelecido em sala de aula – o que vai desde o professor de ciências até o de educação física. “Já fizemos, por exemplo, espetinho de frutinhas com a educação infantil, mostrando a necessidade que a criança tem de consumir alimentos saudáveis”, conta Geonice.

Na cantina do colégio Pallotti, chefiada por Cristina de Carvalho, não há mais guloseimas à venda. Agora, as balas são diet, sem açúcar. “Nós substituímos os lanches fritos pelos assados, inclusive ofereço sucos sem a adição de açúcar. No começo, com a nova lei, a aceitação foi difícil, mas temos diversas opções para substituir por lanches saudáveis”, comenta. Segundo Cristina, saladas de frutas e sanduíches são opções que possuem boa aceitação entre os alunos da instituição.

Desenlaces do projeto

Com a conclusão do projeto, em 2019, e o início da pandemia, a professora Vanessa teve a ideia de criar um curso de extensão, que foi disponibilizado na plataforma Moodle da UFSM para a população em geral. Houve 1,3 mil inscritos, e 315 pessoas terminaram os oito módulos, sendo que, entre os interessados, poucos deles eram proprietários de cantinas: “Eram mais estudantes de nutrição, nutricionistas, professores e funcionários de escolas”, revela a professora. 

O curso está sendo transformado em livro, cujo objetivo é oferecer meios para a comunidade escolar promover uma alimentação saudável e adequada. “A gente pensa não só no caminho da cantina, mas quais são os ambientes, dentro da escola, que promovem (ou não) a alimentação saudável. Não é só a alimentação escolar, é o que traz de casa, o entorno da escola e a cantina, e como todos esses atores da escola podem se ajudar”, conclui Vanessa.

Expediente

Repórter: Ana Luiza Deicke, acadêmica de Jornalismo da Universidade Franciscana (UFN) e estagiária

Ilustrador: Luiz Figueiró, acadêmico de Desenho Industrial e voluntário

Mídia Social: Samara Wobeto, acadêmica de Jornalismo e bolsista; e Eloíze Moraes estagiária de Jornalismo

Edição de Produção: Esther Klein, acadêmica de Jornalismo e bolsista

Edição Geral: Luciane Treulieb e Maurício Dias, jornalistas

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