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É verdade que em breve teremos uma vacina para o novo Coronavírus?



Nesta semana checamos as maiores dúvidas relacionadas à possibilidade de uma vacina

Imagem ilustrativa.

As informações sobre a pandemia de COVID-19 são atualizadas o tempo todo. Na última semana, foi noticiada a possibilidade de uma vacina ser produzida já nos próximos meses. Para entender melhor sobre a produção de vacinas e os estudos que estão sendo realizados, conversamos com o Professor da Universidade Federal do Pampa – UNIPAMPA, Paulo Marcos Pinto. Formado em Ciências Biológicas e com Mestrado e Doutorado em Biologia Celular e Molecular pela Universidade do Rio Grande do Sul, Paulo tem experiência nas áreas de biologia molecular, biologia celular e microbiologia. Confira nossa entrevista:

Agência Da Hora: Como funcionam as vacinas? 

Professor Paulo Marcos Pinto: A imunização através da vacinação é uma das formas mais efetivas de se prevenir doenças infecciosas graves e tentar evitar surtos, epidemias e até pandemias. O objetivo das imunizações é estimular o organismo a produzir anticorpos contra determinados microrganismos, principalmente bactérias e vírus. Nosso sistema imunológico cria anticorpos específicos sempre que entra em contato com um microrganismo. A lógica da vacina é tentar estimular o organismo a produzir anticorpos sem que ele precise ter ficado doente antes. Tentamos apresentar ao sistema imune a bactéria, o vírus, o microrganismo, de forma que haja produção de anticorpos, mas sem o desenvolvimento da doença. Geralmente uma vacina age apenas contra um único microrganismo, por exemplo, a vacina contra o Sarampo não protege o paciente contra a Catapora e vice-versa. Já existem porém vacinas conjuntas, que são na verdade duas ou mais vacinas dadas em uma única administração como a vacina Tríplice Viral, que é composta por três vacinas em uma única injeção, uma única dose: Sarampo, Rubéola e Caxumba. O sistema imune é estimulado simultaneamente contra esses três vírus, entretanto nem toda vacina pode ser dada em conjunto. A grande dificuldade na hora de desenvolver uma vacina é criá-la de modo com que a bactéria, o vírus, consigam estimular o sistema imunológico a criar esses anticorpos, mas não sejam capaz de provocar a doença. Às vezes basta expor o organismo a este microrganismo, bactéria ou vírus,  mortos para que haja a produção de anticorpos e torne o paciente imune a esse microrganismo. Entretanto, nem todos os vírus e bactérias mortos são capazes de estimular o sistema imune, fazendo com que tenhamos que buscar outras soluções para imunizar o paciente.

Agência Da Hora: Por quantas etapas uma vacina passa antes de ser disponibilizada para a população?  

Professor Paulo Marcos Pinto: As fases do desenvolvimento de uma vacina podem ser divididas de diversas formas, mas existe uma convenção das fases: clínica e pré-clínica. Nas fases pré-clínicas a gente tem inicialmente a fase exploratória/laboratorial, a fase inicial, restrita aos laboratórios. Onde serão avaliados centenas ou milhares de moléculas para definir a melhor composição da vacina. Hoje, com análises computacionais e a bioinformática, nós podemos determinar com maior facilidade os alvos específicos para uma vacina ou para diversas vacinas em conjunto. Depois, nós temos ainda na fase pré-clínica, a fase de testes, os melhores componentes para a vacina já foram definidos e passam a ser testados primeiramente invitro, dentro do laboratório, e depois em animais para a comprovação dos dados obtidos. Finalizada a parte pré-clínica, nós partimos para a fase clínica, que é onde agora durante a pandemia da COVID-19 a grande maioria das pessoas está ouvindo falar: “a vacina da Universidade de Oxford está na fase 3 ou 2”. Que é quando partimos para a testagem do produto em seres humanos. Essa fase pode ser dividida em até quatro etapas. Na primeira etapa, o objetivo principal é testar a segurança do produto, ou seja, se utilizam poucos voluntários, geralmente entre 10 e 80 adultos saudáveis. A preocupação neste ponto é a formulação e concentração ótima (dose correta), para que a vacina funcione. Já na segunda etapa, aumentamos o número de pessoas, pois já sabemos a concentração correta da vacina, essa etapa analisa mais detalhadamente a segurança e a eficácia do produto. O número de pessoas aqui pode aumentar até 1000, nessa fase que verificamos a possibilidade de reações adversas, mas sempre testando a segurança e eficácia. A etapa três repete os moldes de segurança e eficácia mas desta vez focando em um público alvo, por exemplo, se a vacina é destinada para pessoas de uma certa idade, só de um sexo ou tem uma característica específica, todos os testes vão ser com esse público alvo. No caso da COVID-19, o público alvo são todas as pessoas, então na verdade a fase três para a vacina contra a COVID-19 será a utilização de milhares de pessoas, em um espectro muito grande de características (idade, sexo, condições físicas). Se a vacina for aprovada na fase três, onde ela é comprovada como eficaz e segura, ela ganha os selos nacionais como o do FDA ( U.S. Food and Drug Administration) nos Estados Unidos e da ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), aqui no Brasil, somente então ela começa a ser distribuída. Mas essa primeira etapa de distribuição mundial é o que a gente chama de fase quatro, ou seja, a vacina vai ser disponibilizada para a população mas continuarão havendo avaliações periódicas com relação à eficácia e segurança.

Agência Da Hora: Quanto tempo normalmente é necessário para que a produção de uma vacina que seja eficaz? 

Professor Paulo Marcos Pinto: Até uma vacina ser utilizada pela população em todo o mundo, ela percorre um longo caminho. É necessário que ocorram muitos estudos, testes e ensaios clínicos, como nós já discutimos, requer muito conhecimento, perícia e técnica. A necessidade dessa demora e cautela fica explícita quando pensamos que é uma dosagem única para bilhões de pessoas. Por exemplo, no caso da COVID-19, nós vamos dar uma única dose, se for necessário, duas doses, para pessoas do mundo inteiro. Ou seja, espera-se que tenhamos que produzir oito bilhões ou algo próximo a oito bilhões de doses. Leva-se normalmente anos para a disponibilização de uma vacina ao público. Muitos anos. O tempo médio para essa disponibilidade popular é de dez anos. Normalmente, esse é o tempo médio. Nós temos recordes de vacinas anteriores que foram disponibilizadas em quatro ou cinco anos.

Agência Da Hora: Se ela for desenvolvida em pouco tempo a chance de apresentar efeitos colaterais é maior?

Professor Paulo Marcos Pinto: Com relação a elas serem desenvolvidas em tempo menor, em teoria, não há chances de apresentar efeitos colaterais maiores. No caso, especificamente, da vacina da COVID-19 estar sendo apressada, se ela for disponibilizada para o público, em tese não há chances de apresentar efeitos colaterais maiores do que as outras se ela passou por todos os passos e testes necessários, os quais a gente já tinha falado. No caso da COVID-19, nós temos uma situação completamente diferente que vai definitivamente bater o recorde de rapidez na criação de uma vacina. O esforço, os estudos, o dinheiro investido, estão sendo maiores e vão permitir uma rapidez nesse desenvolvimento. O prazo normalmente, que estamos falando e trabalhando, é de 18 meses, mas se pensarmos que a vacina de Oxford ou a chinesa possivelmente vão ser disponibilizadas a partir de setembro, outubro ou novembro, vamos chegar a menos de 12 meses. Mas, infelizmente, não tem como saber. O jeito agora é confiar na ciência e na sua capacidade de nos tirar desse cenário.

Agência Da Hora: Como elas são distribuídas, por exemplo, no caso da vacina para COVID-19, quando prontas elas serão disponibilizadas inicialmente para os grupos de risco? Terá algum preço para pessoas que não se enquadram no grupo de risco?

Professor Paulo Marcos Pinto: Com relação a distribuição, experts da indústria farmacêutica afirmam que a fabricação de bilhões de doses da vacina contra o novo coronavírus irá requerer toda a capacidade mundial de humano fatura. Essa capacidade inclui recursos financeiros e humanos para a produção não apenas do fármaco em si, mas também dos frascos herméticos de cada dose, dos equipamentos de refrigeração dos lotes, das seringas ou em spray, se a vacina for oral. A infraestrutura logística para o transporte ágil e seguro da produção, também terá que ser reforçada. Além do engajamento coletivo, será necessário construir e adaptar plantas fabris, de fábricas, para destiná-las especificamentes  para a produção da vacina do novo coronavírus. No mercado das vacinas é comum que fábricas inteiras sejam montadas para cada produto, para cada nova vacina, porque as necessidades de infraestrutura variam bastante de vacina para vacina. Empresas farmacêuticas investem, com o auxílio do governo e fundações, no aumento da capacidade de fabricação mesmo que ainda não se saiba que tipo de vacina será produzida. Esse adiantamento pode significar a construção de unidades fabris as vezes até inúteis, desperdiçando esse tempo e dinheiro, mas evita que se perca tempo na corrida dos laboratórios para frear o vírus. As instalações também serão necessárias para produção de doses para as fases de ensaio clínico, ou seja, agora na fase 3 precisa de unidades fabris que exige teste de milhares de pessoas. Com relação ao calendário de disponibilização muito provavelmente esse calendário começará com os ditos grupos de risco, por exemplo idosos, pessoas com comorbidade,  diabéticos, hipertensos, dentre outros grupos de risco, além de profissionais da saúde, que são necessários ganhar essa primeira iniciativa de vacinação. Com relação a venda em clínicas de vacinas e farmácias especializadas para vacinação imediata de pessoas de fora do grupo de risco, eu penso que no início que essa disponibilidade será muito difícil, pois os governos, os países irão comprar todas as doses que as empresas têm capacidade de produzir.

Agência Da Hora: O Reino Unido e a China estão obtendo resultados promissores na busca pela vacina contra a COVID-19. No Brasil, como anda a pesquisa relacionada à COVID e por que vacinas de outros países estão sendo testadas aqui?

Professor Paulo Marcos Pinto: Em relação à participação do Brasil em pesquisas relacionadas a vacinas contra a COVID-19, tenho conhecimento de algumas iniciativas. Existem duas que estão registradas na Organização Mundial da Saúde, inclusive. O projeto nacional em estágio mais avançado é liderado por cientistas da faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e pelo Laboratório de Imunologia do Instituto do Coração, o INCOR, também em São Paulo. O segundo projeto também brasileiro é da Fundação Oswaldo Cruz de Minas Gerais, a Fiocruz Minas. Ambos os casos estão em fase pré-clínica. A vacina da Fiocruz Minas está relacionada ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Vacinas, que tem base técnica elaborada pelo grupo de imunologia de doenças virais da Fiocruz Minas que está desenvolvendo neste momento outra alternativa nacional. Essa segunda iniciativa conta também com o apoio do Instituto Butantan de São Paulo. Existem outras iniciativas que não estão registradas oficialmente na OMS. Uma delas é do Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos, a Bio-Manguinhos da Fiocruz, que está produzindo um projeto de vacina sintética e esse modelo está prestes a ser testado em animais. Ou seja, ainda está na fase pré-clínica. Essa forma sintética pode ser mais rápida e mais barata e também possuir uma estabilidade de armazenagem maior. Outra iniciativa é do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, que está em fase conceitual e laboratorial, ainda inicial. Existe ainda uma do Instituto Butantan também em fase laboratorial. Por fim, há a empresa Farmacore Biotecnologia em Ribeirão Preto, São Paulo, que estuda a produção de uma vacina que vai utilizar proteínas do próprio vírus. Trabalha pesquisa por antígenos, e prevê iniciar a fase pré-clínica em camundongos a partir deste mês de julho. Os testes em iniciativas internacionais que estão sendo feitos no Brasil, tanto da vacina britânica de Oxford quanto da chinesa, estão sendo realizados aqui pois infelizmente nós somos as cobaias perfeitas no momento, já que o Brasil não tem manejo excepcional dessa pandemia. A alta taxa de transmissão é fundamental para que consigamos testar a eficácia de uma vacina. Então, temos que testar essa fase 3 em ambientes onde haja essa taxa elevada. O mais importante é realizar essa etapa do estudo agora, enquanto a curva epidemiológica ainda está ascendente e os resultados poderão ser mais assertivos.

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Reportagem: Isabela Vanzin da Rocha, Jeferson Matielo e Renata Dornelles

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