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Revista Arco
Jornalismo Científico e Cultural

Vai uma mortadela aí?

Um produto barato que está presente na mesa do café da manhã da maioria dos brasileiros, independentemente da classe social, e que até se tornou alvo de brincadeiras com teor político e ideológico no Brasil. Estamos falando da mortadela, que também virou objeto de pesquisa de mestrado em Ciência e Tecnologia dos Alimentos, na área de Ciência e Tecnologia das Carnes, da UFSM. A autora do estudo é a pós-graduanda Mariana Basso Pinton, orientada pelo professor Paulo Cezar Bastianello Campagnol. A proposta da pesquisa é reduzir o fosfato na mortadela. A substância auxilia na retenção de água e, com isso, diminui o custo. “A finalidade é saber se o fosfato ajuda na textura, na cor e na suculência do produto. Por isso que estou fazendo essa análise sensorial, para ver se os provadores conseguem detectar essa suculência e essa diferença na cor”, explica Mariana. Na atualidade, a busca por produtos mais saudáveis tem aumentado significativamente. Então, a indústria alimentícia vem se adaptando à demanda, buscando desenvolver novas mercadorias. A mortadela, por exemplo, é um produto cárneo emulsionado, ou seja, é uma mistura de ingredientes que são divididos em porções finas e espalhados igualmente, com uma emulsão de gordura em água. A massa é produzida pela fragmentação da carne com o sal e outros ingredientes, formando uma dispersão de água, gordura e proteína. Porém, em consequência da alta quantidade de gordura, sódio e aditivos químicos, os emulsionados, em conformidade com a pesquisa, precisam melhorar a qualidade nutricional, visando, sobretudo, a saúde do consumidor. A análise sensorial Por essa razão, no mês de agosto, o Laboratório de Análises Sensoriais, do Centro de Ciências Rurais, tornou-se um espaço de degustação de mortadelas. A sala possui seis lugares destinados aos provadores, que são protegidos por uma divisória fechada. No local, durante dois dias, as pessoas que experimentaram os embutidos receberam seis amostras do alimento, em pequenos copos plásticos, separados por códigos. Além disso, os degustadores adquiriam uma ficha sensorial, para anotarem o código do recipiente e marcarem suas percepções sobre o sabor, aroma, cor e textura do produto. Junto disso estava um termo de consentimento para os provadores assinarem. E, claro, água, em função do sódio e do gosto. Para fazer um contrabalanceamento no paladar, os participantes tinham à disposição bolacha de água e sal e balas. De acordo com Mariana, há certa discrepância entre leigos e pessoas treinadas para experimentarem a mortadela. “Uma equipe treinada talvez conseguiria perceber certas diferenças, mas, como é um teste aberto, é importante saber a opinião popular. Eu mesma não sou treinada”, enfatiza. A mestranda argumenta que a mortadela comum, que foi utilizada em sua pesquisa, difere-se daquela produzida de forma industrial e vendida no mercado, por causa da quantidade alterada de amido e Carne Mecanicamente Separada (Cms). “Estou usando uma carne nobre. Quem sabe, por isso, ela também ficou com a consistência mais firme. De resto, é a mesma coisa usada na indústria: fosfato, sal de cura (aditivo), coentro e pimenta preta em concentrações bem baixas. É, na verdade, uma mortadela italiana”, informa a Mariana.     O fosfato                  A função do fosfato é sequestrar íons (espécie química eletricamente carregada) metálicos e desunir o complexo actomiosina, que é uma das substâncias mais importantes para a contração muscular. A consequência disso é o aumento do CRA (Capacidade de Retenção de Líquidos), da habilidade de aumentar o pH da carne, diminuição da velocidade de descoloração pela estabilização da vitamina C e o aumento da força iônica. Os efeitos da redução de fosfato em produtos à base de carne são: aumento da suculência, decréscimo da perda por cozimento, melhoria das características sensoriais e redução da força de cisalhamento dos produtos (controle de maciez). O pirofosfato, o tripolifosfato e o metafosfato solúvel são aqueles mais utilizados em carnes. Pesquisadores recomendam a mistura com polifosfato, pois traz bons resultados de rendimento e um nível maior de aceitação. Ainda assim, o estudo alerta que o grande consumo de sódio associado a uma alta quantidade de ingestão de fosfato pode causar riscos à saúde, especialmente em pessoas com doenças renais. No entanto, mesmo para aqueles que não apresentam nenhum problema de saúde é indicado que o consumo não seja exagerado. A ingestão em excesso pode comprometer o metabolismo ósseo, funções cardiovasculares e renais. O baixo consumo de cálcio é agravado pela grande quantidade de fosfato porque os dois nutrientes, apesar de serem indispensáveis, não são iguais, o que pode ser prejudicial à saúde do esqueleto.             Reportagem: Guilherme de Vargas, acadêmica de Jornalismo Edição: Tainara Liesenfeld, acadêmica de Jornalismo Ilustrações: Noam Wurzel, acadêmico de Desenho Industrial Fotografia: Rafael Happke