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Ana Lélia Benincá Beltrame, egressa do Direito da turma de 1975, conta sobre a sua experiência no Consulado e sobre o seu livro “O passeio de Dendiara”.



A primeira entrevista do mês de agosto conta com a presença de Ana Lélia Benincá Beltrame, egressa da turma de Direito de 1975. A diplomata conta sobre sua experiência no Consulado e sobre o seu livro “O Passeio de Dendiara”, no qual relata a  história de uma menina indígena que engravida após sofrer abuso no garimpo.

VOLVER – Para começar, nos conte quais lembranças guarda da UFSM e como a universidade contribuiu para que você chegasse onde está hoje?

ANA LÉLIA – Minha primeira lembrança é dos tempos ainda pré-UFSM! Eu me lembro dos vestibulandos chamados “excedentes”, ou seja, os candidatos, principalmente de medicina, que, na década de 50, passavam no vestibular, ou seja, tiravam nota acima de 50 pontos, mas, para eles, não havia vagas suficientes. Então eles passavam no vestibular, mas não podiam fazer o curso, porque as vagas estavam todas já preenchidas pelos candidatos que tinham alcançado notas mais altas do que as deles. Eram os chamados “excedentes”. Como a medicina era a faculdade que tinha mais candidatos, o número de excedentes da medicina era o mais difícil de ser absorvido pela eventual criação de mais vagas, por exemplo. Nunca dava certo. E era um drama para as famílias.

Segundo minhas enevoadas lembranças, o curso de Medicina em Santa Maria foi criado para absorver os excedentes da Medicina da UFRGS. Deste núcleo, que já tinha a faculdade de Farmácia, surgiu a UFSM. Se bem me lembro. Os historiadores da Universidade podem esclarecer melhor. Mais tarde, com a criação da nota de corte, os “excedentes” deixaram de existir, pois só era formalmente aprovado no vestibular quem alcançasse a nota de corte, que correspondia exatamente ao número de vagas.

Eu convivi, então, muito cedo, tipo aos 9 ou 10 anos de idade, com a figura dos “excedentes do vestibular”. Isto me deixou com a noção muito clara de que não basta estudar para passar, é preciso estudar para ter uma boa classificação. Se não, nada feito! Você não atinge uma nota: você atinge a melhor nota, porque, simplesmente, você não sabe a altura exata da barra que você vai ter que pular. Foi, talvez, a maior contribuição para a minha formação, acadêmica e na vida.

 

VOLVER – Nos conte sobre o livro que lançou recentemente, como foi o processo para escrever, quais dificuldades e desafios encontrou?

ANA LÉLIA – Lancei, em julho último, um livro chamado “O Passeio de Dendiara”, sobre uma história que eu vivi durante o tempo em que fui Cônsul-Geral do Brasil em Caiena, na Guiana Francesa. Era uma história que eu tinha que escrever, pois ninguém conhece direito aquela região do Brasil e da fronteira norte. E ninguém sabe, também, o alto preço humano do garimpo de ouro. Escrevi porque queria que as pessoas soubessem.

VOLVER – Como se deu o processo de estudo sobre a região da fronteira amazônica? Quais foram suas principais descobertas?

ANA LÉLIA – Nós, diplomatas, sempre estudamos sobre o país no qual vamos servir. Não vamos como turistas: vamos como profissionais da promoção dos interesses do Brasil. E, para promover, você tem que conhecer seu público-alvo.

Eu não posso promover os interesses do Brasil na Guiana Francesa se eu desço do avião com informações apenas turísticas, sobre pontos a visitar e lugares para tirar selfies. Estudar um país ou uma região faz parte da função consular e diplomática. Não é opcional. Por isto, estudei geografia física e humana da região da fronteira das Guianas, sua história, a história da definição da fronteira, que foi um dos contenciosos vencidos pelo Barão de Rio-Branco, o povoamento da região, os índios que ali viviam e os que ainda vivem, aldeados ou isolados, a chegada dos escravos, os quilombos que se formaram, a presença dos brasileiros emigrados e europeus vindos da França metropolitana, assim como a atuação do governo francês, inclusive com a criação do centro espacial de Kurú.

A descoberta mais especial foi a de sempre: descobrir que eu não sabia nada…

VOLVER – Atualmente você desenvolve algum outro projeto? 

ANA LÉLIA – Meu projeto atual é … a aposentadoria! Já tenho quase 70 de idade, 45 de Itamaraty, chefio Consulados há 15 anos e sou Embaixadora – o posto mais alto da Carreira de Diplomata – desde 2011. Está na hora de deixar lugar para os mais novos. Não pretenderia escrever mais livros. Minha opção de aposentada, neste exato momento, é viver sem horário. Se eu cansar de viver sem horário, posso pensar em alternativa. Mas, por ora, não consigo vislumbrar nada em especial.

VOLVER – Como é trabalhar no Consulado? Quais são as principais dificuldades enfrentadas?

ANA LÉLIA – O Consulado é um cartório no exterior. Fazemos Certidões de Nascimento, Casamento e Óbito. Fazemos Procurações. Como em um cartório no Brasil. Também fazemos passaportes, como a Polícia Federal faz no Brasil. Orientamos o alistamento militar dos rapazes residentes no exterior que chegam à idade de servir. Orientamos a inscrição no CPF e para o Título Eleitoral. Também organizamos eleições no exterior, com urna eletrônica.

Já organizei três eleições no exterior, todas com a urna eletrônica, e nunca observei nenhum sinal de fraude na votação ou na apuração. Já atendi a jornalistas estrangeiros que queriam conhecer o processo de votação eletrônica do Brasil, transmiti a eles informações recebidas do TSE e eles fizeram perguntas super técnicas, que repassei ao TSE. As respostas foram claras e convincentes: até os mais renitentes profissionais estrangeiros admitem que o sistema de votação eletrônica do Brasil é dos melhores do mundo e a possibilidade de fraude está vários zeros depois da vírgula.

Já a votação com papel impresso é um portal para a fraude e tem muito mais, e mais concretas, possibilidades de candidatos inescrupulosos manipularem os resultados. Fui mesária em eleições com urna convencional e coordenadora de eleições com urna eletrônica, no exterior, e posso comparar empiricamente os dois sistemas. A urna eletrônica ganha de goleada o campeonato da segurança antifraude.

Uma outra coisa que o Consulado faz é prestar assistência a brasileiros em situação de risco, como pessoas que se acidentam no exterior ou adoecem no meio de uma viagem internacional. Nessas horas, as pessoas precisam ter seguro-saúde para viagem. O Consulado não paga tratamento médico ou hospitalização, mas apenas faz o meio de campo entre o doente e o seguro-saúde dele. Traduz as conversas com os médicos, repassa pedidos do doente à enfermagem e dá notícias aos familiares, no Brasil, inclusive entrevistando os médicos com a família do doente ao vivo, com tradução simultânea, no celular, para que os familiares façam perguntas e se tranquilizem.

O Consulado visita brasileiros presos ou detidos. O Consulado não tira ninguém da cadeia, pois a regra é: “aqui se faz, aqui se paga”. Delito praticado no exterior é pago com cadeia no exterior. Mas o Consulado acompanha o caso e procura dar uma assistência ao preso brasileiro. Tampouco o Consulado fornece advogado aos brasileiros presos. Se o brasileiro não tiver recursos para contratar um profissional, o Consulado procura um advogado dativo. E visita o preso para ajuda-lo a se adaptar à rotina da cadeia estrangeira e à ausência de visitas da família, quando o local da prisão é muito longe.

O caso mais dramático de assistência consular que eu fiz, no entanto, foi à menina Dendiara, que descrevi no livro em questão, recentemente lançado. O que eu relato no livro é um exemplo extremo do que vem a ser o atendimento consular a brasileiros no exterior.

VOLVER – Como você se vê daqui a 10 anos?

ANA LÉLIA – À beira mar em uma ilha grega. Ou sob o sol da Toscana. Ou percorrendo os campos de lavanda da Provence. Ou em qualquer outra praia paradisíaca que eu descubra no Brasil. Sempre alugando um AirBnB por temporada – não é tão caro como se imagina – e cozinhando em casa, com os produtos locais. Para isto, já estou munida dos seguintes livros:

Para a ilha grega: Greek cooking in 500 Recipes;

Para a Itália: Ricetario Italiano – La Cucina del Poveri e dei Re (este livro é maravilhoso; eu nunca vou fazer as receitas mais elaboradas, as chamadas Receitas dos Reis, mas as fotos dos pratos são, simplesmente, irresistíveis);

 Para a França provençal: La Cuisine Rapide (comprei um livro de cozinha rápida porque é mais fácil e não rouba tanto tempo como se necessita para certas receitas clássicas francesas).

Espero que os amigos de Santa Maria possam visitar-me nesses lugares e testar se os meus livros de culinária estão dando certo …fica aqui o convite!

 

Adquira o livro “O passeio de Dendiara” em: https://linktr.ee/opasseiodedendy 

Texto: Júlia Ferrari

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