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Negar a ciência climática é parte da tragédia



Como explicar que, mesmo em uma era de tanto avanço tecnológico e acesso à informação, ainda existam pessoas que negam o que está escancarado diante de seus olhos? A tragédia que atingiu o Rio Grande do Sul em 2024 reacendeu esse debate. Muito se tem discutido sobre o negacionismo climático e ambiental como um dos fatores que agravaram o desastre. Em muitos casos, essa negação, que parte dos próprios negacionistas, parece surgir como uma forma de minimizar responsabilidades, uma tentativa, consciente ou não, de se isentar diante da calamidade que paralisou o estado.

Mas, afinal, o que significa negar a crise climática? Trata-se apenas de uma rejeição à ciência, ou seria também um reflexo de interesses políticos, econômicos e culturais profundamente enraizados?

Segundo o professor Renato Souza, do Programa de Pós-Graduação em Extensão Rural da Universidade Federal de Santa Maria, em artigo publicado no Brasil de Fato, a origem do negacionismo climático e ambiental é antiga e está diretamente ligada a movimentos conservadores e de extrema direita, que historicamente defenderam a propriedade privada da terra e a desregulamentação da economia. No Brasil, essa postura se entrelaça com os interesses do agronegócio e das atividades extrativistas, que buscam deslegitimar políticas ambientais para expandir a fronteira agrícola e flexibilizar o uso de áreas de preservação.

Com isso, o professor Souza conclui que o negacionismo climático no país visa preservar e ampliar o modelo de produção primária agroexportadora, frequentemente em detrimento da conservação ambiental e da resposta urgente que as mudanças climáticas exigem.

Imagem retirada da reportagem “Negacionismo climático: conheça suas ideias e características” do site de notícias Politize!

Negacionismo climático 

O negacionismo climático consiste, basicamente, na rejeição das evidências científicas que comprovam o aquecimento global e as mudanças climáticas provocadas pelas atividades humanas. Trata-se de uma postura que se sustenta muito mais em crenças, interesses pessoais e ideologias do que em dados ou comprovações científicas.

Além disso, é curioso que as pessoas que negam a ciência o fazem geralmente  de forma bastante seletiva. Ou seja, elas rejeitam descobertas científicas apenas quando essas conclusões contrariam suas crenças ou interesses. 

Muitos que questionam ou descredibilizam as pesquisas sobre o aquecimento global, dificilmente recusariam um tratamento odontológico, por exemplo. Mesmo sabendo que ambos os conhecimentos, tanto o que possibilita o avanço da medicina quanto o que aponta os riscos das mudanças climáticas, partem do mesmo método científico. No fim das contas, é a mesma ciência que desenvolveu anestesias, tratamentos dentários e vacinas que também alertam sobre o aumento preocupante dos gases de efeito estufa na atmosfera.

O que está em jogo, portanto, não é uma rejeição à ciência em si, mas o desconforto com o que ela representa quando questiona privilégios, o modelo econômico vigente ou a liberdade de consumo. O negacionismo climático, nesse sentido, é uma reação defensiva à possibilidade de mudanças estruturais na economia e no estilo de vida, necessárias para enfrentar a crise ambiental.

Esse cenário se torna ainda mais evidente diante de acontecimentos concretos, como a tragédia em Porto Alegre em 2024. Mesmo após as enchentes devastadoras que atingiram a cidade, o poder público manteve posturas criticadas. O presidente da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), Heverton Lacerda, em uma entrevista concedida para a rede de notícias DW, questionou a liberação de R$27 milhões em dinheiro público para o evento privado South Summit, em vez de priorizar projetos de reconstrução e recuperação ambiental. Lacerda e outras entidades levaram a denúncia ao Ministério Público e ao Tribunal de Contas do Estado, destacando também a ausência de ações efetivas de recomposição de matas e áreas naturais.

Apesar da experiência traumática vivida pela população, o governo estadual, segundo a Agapan, não alterou sua postura de pressão sobre o meio ambiente. O que evidencia o quanto o negacionismo climático, ou a resistência em aceitar e agir sobre as evidências científicas, ainda influencia decisões políticas e administrativas.

Como explicar para alguém que não acredita?

O escritor norte-americano Andrew Hoffman, em seu livro “Como a Cultura Molda o Debate do Clima”, propõe que o caminho agora é construir confiança. Em sua obra, ele explora como as diferenças culturais e ideológicas moldam a compreensão e a resposta ao aquecimento global, defendendo que a ciência, sozinha, pode não conseguir convencer os mais resistentes a serem ignorantes. 

Segundo Hoffman, existem três possíveis caminhos para sair do impasse atual. O primeiro é otimista: surgiria uma solução técnica capaz de reverter os danos, como uma tecnologia que removesse o excesso de carbono da atmosfera. O segundo é pessimista: o debate continuaria se polarizando, com cada lado defendendo seus valores e tentando impor suas crenças, o que favoreceria a propagação de dúvidas e dificultaria ações efetivas. 

O terceiro caminho, e o único viável para Hoffman, é a busca por consenso. Esse cenário exige que ambos os lados reconheçam a radicalização de suas posições e trabalhem juntos para encontrar interesses em comum.

Como parte do esforço para combater a desinformação no debate ambiental, que dialoga justamente com a ideia de Hoffman, o Observatório do Clima, uma rede de organizações da sociedade civil, criou a plataforma Fakebook.eco em 2019. A iniciativa visa sistematizar, de maneira didática, o conhecimento sobre mitos, distorções e mal-entendidos comuns relacionados ao meio ambiente no Brasil. Além de funcionar como um repositório para desmentir informações falsas, a plataforma também realiza checagens rápidas de declarações de autoridades e fake news ambientais.

Um exemplo de uma dessas produções foi a realizada pela Fakebook.eco em 2022, que aborda a falsa ideia de que não há consenso na comunidade científica sobre o aquecimento global. O trabalho destaca que mais de 99% dos estudos científicos revisados por pares entre 2012 e 2020 reconhecem a influência humana na mudança climática. Esses dados foram confirmados por uma pesquisa da Universidade de Cornell, publicada em outubro de 2021. O estudo, liderado pelo professor Mark Lynas, analisou cerca de 90 mil publicações científicas sobre a crise climática. Segundo o autor, os resultados tornam a discussão sobre a existência de consenso científico um “caso encerrado”. De acordo com o levantamento, não há debate relevante entre especialistas que neguem a mudança climática induzida pela ação humana.

Frente a esse contexto de desinformação e resistência, surgem iniciativas como o PET Educom Clima, criado em 2024 no curso de Jornalismo da UFSM, campus Frederico Westphalen, sob a coordenação da professora Cláudia Herte de Moraes. O grupo nasceu a partir de uma chamada do governo federal para fortalecer a integridade da informação, uma diretriz proposta pela ONU para enfrentar a desinformação no ambiente digital.

O PET Educom Clima trabalha com a educomunicação climática, promovendo o diálogo aberto e crítico com a sociedade, especialmente no ambiente escolar. Através da produção de conteúdos sobre meio ambiente e do incentivo à análise crítica das informações que circulam na mídia, o grupo busca explicar, de forma acessível, as bases científicas válidas sobre o aquecimento global. Assim, contribuindo para a formação de uma cidadania ambientalmente consciente.

A superação do negacionismo climático passa, portanto, pela implantação de políticas de promoção da educação, da informação de qualidade, bem como pela mobilização social. Tarefas essas que se tornam ainda mais urgentes diante das consequências reais e trágicas da crise ambiental.

Raquel Teixeira Pereira | Bolsista do PET Educom Clima

 

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