A alfabetização é um passo importante no exercício da cidadania. Através da leitura, escrita e compreensão, o indivíduo inicia um processo de trocas culturais, comunicação e acessibilidade a serviços oferecidos por instituições sociais. Mas, e quando a criança é ensinada a ler e escrever em uma língua, e utiliza outra para se comunicar com os demais? Essa é a realidade das pessoas surdas. No ensino tradicional, elas são alfabetizadas em português, mas utilizam a Língua brasileira de sinais (Libras) para se comunicar. Uma alternativa para solucionar essa questão surgiu na década de 1970, na Dinamarca, e se chama SignWriting.
O SignWriting é um sistema para escrever a língua gestual, como a língua de sinais. Ele expressa os movimentos e formas das mãos, antes registrados apenas em materiais visuais como vídeos. Desde 1996, a professora Marianne Rossi Stumpf estuda o sistema, e propõe novas formas de inseri-lo no cotidiano de pessoas com deficiência auditiva. Ela, que perdeu a audição com nove anos de idade, é doutora em Informática na Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Em sua tese, trabalhou com o letramento de crianças surdas, utilizando o SignWriting e a Língua Brasileira de Sinais.
A pesquisadora afirma que houve um desenvolvimento considerável entre as crianças que não “partiram” do português para sua alfabetização. “A criança surda vai se desenvolver a partir da visualidade, ela vai ter o conhecimento e os conceitos a partir do visual. O SignWriting é uma escrita visual, ela vai de acordo com o conhecimento da criança, com as representações simbólicas que a criança faz do mundo” considera Marianne.
No entanto, Marianne lembra que ainda não há um registro, de fato, da língua de sinais, o que leva a existirem diferentes gestos para a mesma palavra ou, ainda, novos sinais serem criados a partir de demandas específicas que vão surgindo. “Na posse da ex-presidente Dilma, não havia um sinal único para ela, já que não era uma pessoa conhecida pela comunidade”, exemplifica a pesquisadora. “No entanto, logo se especificou um sinal próprio para ela. Isso também acontece com novos termos tecnológicos e técnicos”, conclui Marianne.
CELSUL
Na UFSM, Marianne foi palestrante no XII Encontro do Círculo de Estudos Linguísticos do Sul (CELSUL), ocorrido em setembro. Na oportunidade, ela abordou a realidade político-social dos surdos no país, destacando o Instituto Nacional de Educação de Surdos e o Plano Nacional de Educação.
Qual é o papel do Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES)?
O INES é o instituto mais antigo que temos no Brasil. Ele tem o curso de Pedagogia bilíngue [português e Libras], tem atendimento precoce em língua de sinais para bebês e ainda tem treinamento da fala oral, que chamamos de oralismo. No entanto, pesquisas já apontam que a percepção máxima da leitura labial é de apenas 20% do que é dito. Os profissionais do INES atuam em vários locais, se deslocando para ensinar. É um trabalho muito grande, com muitos profissionais atuando, além de ser referência na formação de profissionais de outros estados.
Qual é a função do Plano Nacional de Educação (PNE) no contexto brasileiro atual?
O Plano Nacional de Educação abarca a questão da educação bilíngue para surdos. É um plano que orienta os espaços escolares para que eles se tornem bilíngues. As escolas, sejam elas inclusivas ou não, recebem orientações de como proceder. Por exemplo, como trabalhar literatura ou matemática. Existe uma orientação neste documento com relação ao trabalho com a língua de sinais, o incentivo à formação de professores e ao papel dos intérpretes dentro do ambiente educacional.
Reportagem: Stephanie Rosa Battisti
Fotografias: Rafael Happke