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Editorial

Nunca antes na história recente da humanidade atravessamos períodos tão turbulentos, de incertezas e desconfiança em diferentes aspectos. São numerosas as situações de risco e crise que atravessam nossa sociedade: na esfera política, empresarial e governamental, no contexto cultural, social e ambiental, nas áreas da saúde, educação, religião e segurança, nos espaços online e offline, em âmbito nacional ou internacional. Acumulam-se e sobrepõem-se as situações de risco e crise neste período. São situações críticas relacionadas a vazamento de dados, à corrupção, à ética, à diplomacia, a defeitos em produtos, etc. que impactam direta e indiretamente nas pessoas e nos diversos campos sociais, causando pandemias, catástrofes, desemprego, fome, mortes e outras consequências em grande escala. Isso porque a cultura da prevenção, da proteção e do cuidado não é uma realidade nas organizações, tornando o terreno fértil para que crises se instalem.     

                         

Entre as causas de uma crise, falhas, omissões e erros de gestão e de administração se sobressaem: seja pela falta de planejamento, de prevenção, de auditorias, de controle, de treinamentos, de simulações, de transparência nos negócios e má gestão de pessoas, seja por desinformação, mau relacionamento com a imprensa, arrogância da alta administração em negar os alertas emitidos pelo entorno. Embora as organizações devessem ter um plano de gestão de crises, elaborado por uma equipe multidisciplinar, a realidade mostra o contrário. Principalmente em alguns ramos de atuação em que a probabilidade de crises é grande, a previsibilidade deveria ser levada em conta a fim de resguardar a reputação da marca e, muitas vezes, evitar a perda de vidas!    

     

Nessa conjuntura, naturalmente, forças externas e internas ameaçam o equilíbrio social, das organizações, dos sistemas e – por isso – cada vez mais se faz necessário atentar aos riscos presentes nas atividades desenvolvidas por órgãos públicos, organizações não-governamentais, empresas, marcas e figuras públicas. Os riscos são permanentes, que precisam ser – a partir da gestão de riscos – identificados como forma de antecipar situações críticas. Dessa forma, é possível construir cenários de atuação, disponibilizar informações, organizar logística de proteção ou resgate e evitar danos em maior escala, por exemplo. Estes sinais ou assuntos emergentes com potencial desestabilizador precisam ser detectados na leitura permanente de cenários operada pelos profissionais da Comunicação e de outras áreas-chave, tendo em vista que vivemos em uma sociedade de risco (BECK, 2002). Sendo assim, viabiliza-se o processo de comunicação preventiva – ou seja, a comunicação de risco – a fim de evitar ou diminuir as consequências negativas para as pessoas, para o meio ambiente, para a sociedade e para os negócios. 

                                                        

No entanto, crises podem se instaurar mesmo que muitos esforços tenham sido feitos para a prevenção ou mitigação de danos. Nesse momento, a comunicação de crise exerce papel fundamental dentro do processo de gestão da crise. Embora as práticas comunicacionais não se iniciem com a crise (mas sim antes de qualquer situação crítica), é neste momento que se intensifica o trabalho com o objetivo de esclarecer, posicionar, informar, solucionar quaisquer demandas junto do comitê criado especificamente para esta finalidade. E mesmo que a situação se torne caótica, logo em seguida as crises trazem ensinamentos e acabam implicando na reorganização e na transformação das estruturas, dos processos e dos posicionamentos. Apesar de tudo, é uma oportunidade para a organização aprender e melhorar sua atuação junto à sociedade.   

                                                                       

Nesse contexto de aprendizado, duas premissas merecem destaque. Primeiro, a comunicação tem papel essencial no processo de gestão e gerenciamento de riscos e crises. É ela juntamente com setores organizacionais específicos (compliance, gestão de riscos, governança, segurança do trabalho, etc.) que se revelam competentes pela prevenção, por dar a conhecer, pela transparência, pela mitigação dos danos, evitando mortes, desgastes de reputação e imagem, ainda mais prejuízos e crises em série. Segundo, para gerar conhecimento científico e aprender com as situações pelas quais as organizações passam, é preciso monitoramento e reflexão a partir dos acontecimentos à luz das teorias. A partir de recente estudo de levantamento bibliométrico e análise das características e abordagens de pesquisas no Brasil relativas aos temas de risco e crise no contexto da comunicação, as pesquisadoras concluíram que:

 

[…] a produção científica sobre o tema de gestão de risco e de crise no Brasil ainda é muito centrada na descrição e análise de casos isolados, em grande parte oriundos do segundo setor, o que dificulta a legitimação de um campo de pesquisa robusto, tanto em volume quanto em qualidade de discussão teórico-científica. Entende-se por campo de pesquisa robusto aquele que é capaz de fornecer discussões aprofundadas sobre um tema, com sólidas e diversificadas metodologias de pesquisa, capaz de oferecer suporte a práticas e à geração de novos conhecimentos e avanços para a área de conhecimento em questão. Acredita-se que o futuro da pesquisa sobre a gestão de risco e de crise no Brasil deve passar, necessariamente, pelo reconhecimento da relevância e pertinência dos temas em termos de pesquisa, formação de pessoas e geração de novas práticas profissionais. […] Portanto, continuar negligenciando a produção de conhecimento científico sólido a esse respeito não contribuirá, a longo prazo, para a profissionalização de práticas de comunicação em sentido proativo ou reativo (NUNES, OLIVEIRA, 2021, p. 12-13).

 

Nesse sentido, para que os aprendizados relatados e o conhecimento produzido a partir de cenários de risco e crise, precisamos monitorar, observar, analisar e sistematizar os dados. Diante do exposto, que corrobora a importância destes temas para a sociedade, para as organizações que fazem parte dela e para as pessoas, justifica-se a criação deste observatório, dispositivo científico inédito no Brasil dedicado aos temas de risco, crise, gestão de risco, gestão de crise e comunicação de crise, especificamente na área de Comunicação Organizacional e Relações Públicas. Nessa direção, além de coletar e disponibilizar a produção científica, busca-se identificar casos inspiradores de gestão da comunicação de crise, uma vez que o objetivo aqui não é apenas mostrar situações de risco e crise desastrosas com gestões igualmente desastrosas.  O intuito, para além dos tensionamentos com as perspectivas teóricas e com a devida crítica, trata-se de analisar as práticas sob as óticas humana, social, cultural e ambiental, a fim de construir não só um repositório ou ser fonte de pesquisa, mas um espaço de discussão e de referência também para profissionais de comunicação, gestores e veículos de comunicação.                                                                                                                          

De forma bastante otimista – na missão de monitorar pesquisas e práticas – o observatório espera se deparar com situações em que se visualize, de um lado – o da academia – o esforço em ampliar e aprofundar os conhecimentos sobre risco e crise pela perspectiva da comunicação. Do outro – o das organizações – as práticas de gestão comunicacional que tenham compromisso e responsabilidade com as pessoas e com a sociedade, principalmente em contextos de crise.

 

Prof. Dr. Jones Machado (UFSM)

Coordenador-Geral do Observatório da Comunicação de Crise