A extensão universitária é uma das bases que sustentam o papel social da universidade. Por meio dela, o conhecimento produzido no meio acadêmico ultrapassa as salas de aula e se transforma em ações que promovem diálogo, aprendizado mútuo e impacto real na comunidade. No dia 3 de novembro, durante a 40ª edição da Jornada Acadêmica Integrada (JAI) a Professora Angela Araujo da Silveira Espindola e o Técnico-Administrativo em Educação Raone Somavilla, serão agraciados com menções honrosas na premiação dos Destaques da JAI, na categoria Destaque Extensionista.
Raone Somavilla é Arquivista na UFSM e nos últimos dez anos atuou em pelo menos 23 projetos/programas de extensão. Dentre as ações realizadas, Raone destaca algumas: a restauração de peças do acervo do Centro de Pesquisas Genealógicas de Nova Palma, enquanto coordenador da fase um e dois do projeto Restauração e Encadernação de Livros e Documentos no Centro de Pesquisa Genealógicas, desenvolvidas entre 2016 e 2020; a restauração do único exemplar do primeiro volume do Jornal A Razão, contendo os números do primeiro ano de circulação do periódico, como coordenador do projeto Restauração e Digitalização do Primeiro Volume do Jornal a Razão de Santa Maria 10 de Outubro a 30 de Dezembro de 1934, entre os anos de 2016 e 2018; e a recuperação e restauração de livros de registro do Cartório de Imóveis de Santa Maria, como coordenador do projeto de prestação de serviços “Restituimus”, em parceria com a FUNDEP (UFMG), iniciado em 2022, com duração prevista até 2027.
Para o TAE, as ações de extensão voltadas para o patrimônio arquivístico são de extrema importância, pois atendem a uma demanda da sociedade que diz respeito à preservação e restauração de arquivos, bibliotecas, ou mesmo de coleções pessoais. “Existem, além dos impactos diretos, que dizem respeito a preservação da materialidade em si, outros indiretos, que são difíceis de mensurar, principalmente pelo fato de que são percebidos no longo prazo, mas que estão relacionados com a preservação de bens culturais, que beneficiam e impactam a sociedade local como um todo”, explica.
De acordo com Raone, receber essa menção honrosa como destaque extensionista significa o reconhecimento de um trabalho que nem sempre ganha a devida visibilidade, especialmente tratando-se de ações coordenadas por TAEs. “Apesar dos desafios de fazer extensão, especialmente no que diz respeito aos limitados recursos, entendo que essas ações são fundamentais para a formação de profissionais preparados para servir à sociedade: é uma forma também de dar um retorno e estabelecer um vínculo com a comunidade externa”, comenta o TAE.
Atualmente, Raone coordena o Projeto Restituimus, que objetiva promover a preservação do patrimônio histórico documental em acervos arquivísticos e bibliográficos por meio de políticas de conservação preventiva e implementação de ações de restauração de livros e documentos, onde são empregadas técnicas de restauração e encadernação. O projeto conta com o apoio da Fundação de Apoio à Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais e tem ampliado a atuação do Laboratório de Restauração de Documentos por meio de diversas parcerias. Além disso, o projeto tem permitido a captação de recursos para o Laboratório, o que implica numa melhoria das condições de trabalho e, consequentemente, melhorias nas atividades de pesquisa, ensino e extensão desenvolvidas.
A Professora Angela Araujo da Silveira Espindola é graduada pela UFSM, e atualmente atua como docente no departamento de Direito da Universidade. Nos últimos anos, Angela tem desenvolvido projetos de ensino, pesquisa e extensão voltados à interface entre Direito e Literatura e Direito e Arte, com o objetivo de promover a formação crítica e humanística de estudantes e a democratização do conhecimento jurídico. Para a docente, projetos de extensão, como “Livros que Livram: remição pela leitura”, que está em andamento no momento, buscam criar espaços de encontro entre a universidade e a comunidade, articulando saberes acadêmicos e práticas culturais. “Acredito que esses projetos têm relevância singular para a extensão, por desconstruírem as barreiras tradicionais do ensino jurídico e ampliarem o acesso à reflexão sobre justiça, linguagem e direitos”, destaca.
Angela afirma que receber essa menção honrosa representa o reconhecimento de um trabalho construído de forma coletiva, dialógica e comprometida com a transformação social. “Somos hoje uma equipe de quase 30 pessoas, composta por docentes e discentes, com estudantes de graduação e pós-graduação, no Direito, Letras, Psicologia, Serviço Social e Comunicação. Receber esse destaque significa, sobretudo, reafirmar a relevância da extensão como prática que torna o conhecimento universitário socialmente vivo e emancipador. É um estímulo a continuar promovendo ações que aproximem o Direito das múltiplas expressões humanas”, comenta a professora.
O primeiro contato da docente com a extensão universitária aconteceu ainda nos anos 90, enquanto era estudante de Direito, experiência essa que marcou seu modo de compreender a universidade como espaço mais forte. Mais tarde, como docente, no início dos anos 2000, atuou como coordenadora de um projeto de extensão que atendia mulheres vítimas de violência doméstica. “Hoje tenho uma visão mais ampla da extensão universitária e reconheço seu impacto para os estudantes, docentes e também para a comunidade, vendo-a como catalisadora de transformações estruturais”.
Ao destacar o impacto da extensão no projeto “Livros que Livram”, que tem como objetivo geral a remição de pena pela leitura, a professora nota o quanto a parceria entre a Universidade e a comunidade foi fundamental para gerar o fortalecimento do pensamento crítico e a ampliação do acesso à leitura e à arte, além de contribuir para o engajamento de estudantes e participantes em debates sobre direitos e justiça. “Nas atividades, observa-se o despertar de vocações acadêmicas e o protagonismo de sujeitos historicamente silenciados, além de uma maior aproximação entre o universo jurídico e a vida cotidiana. Nossas atividades incluem rodas de leitura em que debatemos obras, escutamos perspectivas múltiplas e oferecemos feedback sobre resenhas. A cada livro lido, cuja resenha tenha sido aprovada, cada pessoa presa tem direito a 4 dias de pena remida. Ou seja, se 12 livros forem lidos no ano – teto máximo – poderão ser remidos 48 dias. Já impactamos centenas de pessoas nesses últimos 5 anos. O impacto mais profundo não está meramente na remição de pena, mas na concretização de um direito fundamental, como diz Antonio Candido, o direito à literatura”, afirma.
Ao ser questionada sobre projetos futuros, a professora planeja desenvolver projetos que articulem extensão, pesquisa e cultura digital, com foco em desinformação, direitos humanos e inteligência artificial, sempre com conexão com o movimento do Direito e Literatura. “Em 2012, juntamente com alguns professores, fundamos uma associação científica sem fins lucrativos que tem como propósito o fomento de estudos, pesquisas e ações relacionadas ao Direito e Literatura. Essa associação chama-se Rede Brasileira Direito e Literatura e congrega hoje 20 grupos de pesquisa e extensão na América Latina, integrando hoje Law and Humanities Hub do Institute of Advanced Legal Studies da Universidade de Londres. A fundação da RDL foi um passo bem importante que hoje impacta diversos projetos interinstitucionais, mas sobretudo pesquisadores e extensionistas. Somos um grupo muito ativo, que se reúne anualmente no Colóquio Internacional de Direito e Literatura (hoje na sua 14ª edição) e que produz pesquisa de qualidade, divulgando-a na Anamorphosis: Revista Internacional de Direito e Literatura”. Para Angela, a extensão lhe transformou em uma professora mais sensível às realidades que atravessam o Direito e mais comprometida com metodologias dialógicas e interdisciplinares.
O trabalho desenvolvido pelos servidores Raone e Angela inspira novas práticas e mostra que a extensão é mais do que uma atividade complementar: é uma forma de reafirmar o compromisso público da UFSM com o conhecimento que se constrói junto das pessoas e para elas.
Texto: Luísa Soccal, bolsista de jornalismo da Subdivisão de Comunicação do CCSH.