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Algoritmização do Gatekeeping? Tendências nas pesquisas recentes em Jornalismo

por Bruna Eduarda Meinen Feil



Fala, pessoal! Espero que estejam todos bem. 

Depois de um período de férias, estamos de volta com os textos do EJor! Nesse meio tempo, passei pelo exame de qualificação do meu projeto de dissertação e hoje decidi trazer uma das discussões sobre Teoria do  Gatekeeping – meu objeto de pesquisa – que estão no meu radar! 

É de nosso conhecimento que com a incorporação das plataformas nas rotinas jornalísticas, espaços e funções antes eminentemente demarcados pela atividade humana passam a ser permeados também por agentes técnicos, como é o caso dos algoritmos, o que complexifica ainda mais os processos produtivos vinculados ao campo do Jornalismo. A utilização de métricas e a recomendação algorítmica é uma realidade nas redações mundo afora e, por isso, hoje vou trazer algumas indicações de leitura que tensionam o papel dos algoritmos e a Teoria do Gatekeeping. 

No artigo “Recommended for You: How Newspapers Normalise Algorithmic News Recommendation to Fit Their Gatekeeping Role”, o pesquisador dinamarquês Lynge Møller discute como ocorre o uso da recomendação algorítmica em redações escandinavas. O texto publicado em 2022 percebe que, no contexto analisado, o conceito de gatekeeping continua relevante para explorar os processos jornalísticos, com os jornais invocando noções de controle editorial tanto para argumentar contra a incorporação de recomendação algorítmica, quanto para normalizar sua implementação junto às normas e ideais jornalísticos tradicionais (MØLLER, 2017). 

Outros estudos também têm descrito o processo através do qual as organizações de notícia tentam normalizar a adoção de sistemas de recomendação algorítmica mantendo-se fiéis aos seus papéis tradicionais ou incorporando valores inerentemente jornalísticos. Para exemplificar, no artigo “Safeguarding the Journalistic DNA: Attitudes Towards the Role of Professional Values in Algorithmic News Recommender Designs” as autoras Mariella Bastian, Natali Helberger e Mykola Makhortykh (2021) analisam dois jornais dos Países Baixos e da Suíça para investigar como os profissionais de mídia percebem o impacto do uso de sistemas de recomendação algorítmica. Publicado na revista Digital Journalism, o estudo mostrou uma grande conscientização entre os profissionais de mídia sobre a responsabilidade que precisam ter com o uso de sistemas de recomendação algorítmica. Uma observação que caracteriza a maioria dos resultados deste estudo é que os profissionais entendem os sistemas de recomendação essencialmente como uma extensão das atividades editoriais das redações de notícias e, dessa forma, a integração desse tipo de mecanismo nas rotinas jornalísticas deve aderir aos valores jornalísticos. As pesquisadoras oferecem ainda contribuições interessantes no que se refere a percepção dos valores jornalísticos considerados mais relevantes pelos jornalistas entrevistados na pesquisa:


Nossa análise identificou uma seleção de valores que são percebidos pela maioria dos profissionais entrevistados como valores jornalísticos “essenciais” para o design e implementação de sistemas de recomendação algorítmica. Esses valores incluem transparência, diversidade, autonomia editorial, uma ampla oferta de informações, relevância pessoal, usabilidade e surpresa. Outros valores, como objetividade, neutralidade e prazer no uso, também parecem ser importantes, mas são considerados menos essenciais para o design algorítmico, pelo menos entre os entrevistados deste estudo (BASTIAN, HELBERGER, MAKHORTYKH, 2021, p. 855, tradução e grifos nossos).


Pesquisas como essa, embora não tenham a discussão da Teoria do Gatekeeping como eixo central, apontam para a manutenção da relevância do papel do jornalista no controle editorial. Uma vertente de estudos tem conduzido investigações que corroboram com essa perspectiva (NIELSEN, GANTER, 2018; SINGER, 2005).  Os resultados dessas pesquisas acreditam que há uma tendência na indústria de notícias de adotar novas tecnologias de maneira que se encaixem em estruturas organizacionais, práticas de trabalho e normas e ideais jornalísticos. Contudo, esse processo é complexo e permeado por conflitos éticos. No estudo “Designing What’s News: An Ethnography of a Personalization Algorithm and the Data-Driven(Re)Assembling of the News”, as pesquisadoras dinamarquesas Schjøtt Hansen e Jannie Møller Hartley mostram que a incorporação de valores-notícia ao sistemas algorítmicos não é tão simples, pois  “quantificar” o trabalho jornalístico e a tomada de decisão editorial envolve reconfigurar esses valores em formatos com os quais o sistema algorítmico consegue interagir, ou seja, binário, predefinido e aplicável a todos os artigos (HANSEN, HARTLEY, 2021).

Enquanto uma tendência de estudos busca normalizar a incorporação de sistemas de recomendação algorítmica e enfatizar a manutenção de elementos importantes da prática jornalística, por outro lado, é possível encontrar na literatura pesquisas que apontam para os efeitos negativos da utilização desses tipo de sistema, uma vez que ao encaminhar para os usuários notícias que estão relacionadas às suas preferências, podem gerar espaços descritos como “câmaras de eco” (SUNSTEIN, 2018) ou “bolhas de filtro” (PARISER, 2011). Nessa vertente, a personalização no consumo de notícias online é tratada como especialmente problemática e teóricos alertam para o fato de que, na prática, isso pode limitar o que as pessoas acessam, estreitando seu conhecimento de mundo.  Isso ocorre porque os algoritmos direcionam os usuários para determinadas fontes de notícias em detrimento de outras, levando pessoas a conteúdos que se alinham com seus interesses pessoais registrados em atividades anteriores (NECHUSHTAIA, LEWIS, 2019). Nesse cenário, os próprios jornalistas mostram-se preocupados com a perda do controle editorial. 

Por hoje é isso! Em breve volto com novas discussões!

Abraços,

Referências: 

BASTIAN, Mariella; HELBERGER, Natali; MAKHORTYKH, Mykola. Safeguarding the journalistic DNA: Attitudes towards the role of professional values in algorithmic news recommender designs. Digital Journalism, v. 9, n. 6, p. 835-863, 2021.

HANSEN, Anna Schjøtt; HARTLEY, Jannie Møller. Designing what’s news: An ethnography of a personalization algorithm and the data-driven (re) assembling of the news. Digital Journalism, p. 1-19, 2021.

MØLLER, Lynge Asbjørn. Recommended for you: how newspapers normalise algorithmic news recommendation to fit their gatekeeping role. Journalism Studies, v. 23, n. 7, p. 800-817, 2022.

NECHUSHTAI, Efrat; LEWIS, Seth C. What kind of news gatekeepers do we want machines to be? Filter bubbles, fragmentation, and the normative dimensions of algorithmic recommendations. Computers in Human Behavior, v. 90, p. 298-307, 2019.

NIELSEN, Rasmus Klein; GANTER, Sarah Anne. Dealing with digital intermediaries: A case study of the relations between publishers and platforms. New media & society, v. 20, n. 4, p. 1600-1617, 2018.

SINGER, Jane B. The political j-blogger: ‘Normalizing’a new media form to fit old norms and practices. Journalism, v. 6, n. 2, p. 173-198, 2005. 

SUNSTEIN, Cass R. #Republic: Divided democracy in the age of social media. Princeton University Press, 2018.

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