Circula nas redes sociais digitais uma série de mensagens com dicas caseiras para combater o novo coronavírus. Entre as informações compartilhadas está a de que a “Revista de Virologia” teria publicado estudo sobre a acidez do novo coronavírus. Ainda, segundo a postagem, tudo o que precisaríamos fazer para combater o vírus seria ingerir mais alimentos alcalinos. São citados como alimentos do tipo limão, abacate, alho, manga, tangerina, abacaxi, dente de leão e laranja.
A pesquisa que deu origem à mensagem
De acordo com o site Africa Check, um estudo publicado no Jornal de Virologia, da Sociedade Americana de Microbiologia, em 1991, foi o responsável por parte das informações disseminadas na mensagem. O trabalho, intitulado “Alteração da dependência do pH da fusão celular induzida por coronavírus: efeito de mutações na glicoproteína Spike”, não estudou o novo coronavírus, conhecido como SARS-CoV-2.
A pesquisa analisou, na época, o coronavírus responsável pela hepatite em camundongos, ou hepatite murina, o MHV4. E, mais, em nenhum momento avaliou a questão associada ao organismo humano. Além disso, o artigo é bastante claro: não pretende descobrir qual o nível de pH do vírus.
O objetivo do estudo era compreender o que acontece quando “células murinas suscetíveis” (células de ratos ou camundongos) são infectadas pelo MHV4 em um ambiente de pH “de 5,5 a 8,5”. No entanto, vale ressaltar que o “tipo” de coronavírus analisado pelo estudo não é o mesmo que causa a Covid-19.
E, embora a mensagem espalhada nas redes sociais faça uma referência ao estudo de 1991, é preciso atentar para o caráter vago e fora de contexto. Nenhuma outra informação sobre a “Revista de Virologia” é citada na mensagem.
Afinal, o que é pH?
O pH ou potencial hidrogeniônico é uma escala de 0 a 14 que mede a concentração de íons de hidrogênio, e serve para avaliar o grau de acidez, neutralidade ou alcalinidade de uma substância ou uma solução.
A professora Giovana Stefanello explica que “quimicamente falando, temos como classificar algumas substâncias em relação ao seu potencial hidrogeniônico. Quanto mais próxima de 0, mais ácida é a substância. Mais próxima de 7, diz-se que é neutra. E mais próxima de 14, mais básica”.
O pH dos alimentos e do vírus
Na mensagem que checamos, o abacate e o dente de leão, citados como bons alimentos para combater o vírus, são listados com pH entre 15,6 e 22,7, respectivamente. E, como informa Giovana Stefanello, isso é cientificamente impossível, já que a escala que mede o potencial hidrogeniônico vai até 14.
A postagem tem outros erros graves, como o suposto pH do próprio coronavírus. Para o virologista Rômulo Nery, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, “esse pH de 5,5 não é próprio do vírus, mas é o que ele precisa encontrar no ambiente celular para se propagar”. Além disso, ressalta que esse fato não pode ser mudado pela alimentação.
Desinformação
Ainda, segundo a professora de química, não é possível mudar o pH da garganta para o pulmão – onde chega o vírus – devido à alimentação ser mais ácida ou mais básica. Assim, mesmo que fortaleça o organismo, a ingestão dos alimentos listados pela mensagem, assim como tantos outros, não é eficiente no combate ao vírus.
Portanto, a mensagem com supostas dicas de alimentação para combater o vírus é uma desinformação. Há vários erros científicos.
Mitômetro Coronavírus é um projeto de checagem de fatos da revista Arco voltado para a temática da pandemia com o objetivo de combater a desinformação.
Compreenda os selos:
Comprovado – fato com evidências científicas e que pode ser explicado a partir de relatórios, documentos e pesquisas confiáveis e com metodologias factíveis.
É possível – selo para uma checagem com elementos reais. Não há comprovação 100% em função de determinados indícios, detalhes ou situações.
Depende – é o meio termo entre o que é mito e a verdade. Não existe um consenso entre as fontes e os especialistas. Também usado para quando faltam evidências ou para destacar que o fato pode ocorrer em uma determinada situação.
Improvável – refere-se a uma situação com pouquíssima possibilidade de ser real.
Mito – não existe possibilidade alguma de ser verdade. Existem evidências que provam o contrário. Enquadram-se aqui as teorias da conspiração, as lendas da internet e as noticias falsas.