As bibliotecas da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) reúnem um acervo de 5.464 periódicos impressos, com 280.235 exemplares. Mesmo antes da existência da internet e das plataformas digitais, já havia uma intensa prática científica entre pesquisadores e as bibliotecas eram as principais responsáveis por armazenar e divulgar publicações de artigos e acervos periódicos de pesquisas científicas. Quando existe a necessidade de rememorar estudos antigos, que muitas vezes não estão disponíveis em outros portais, o serviço de Comutação Bibliográfica (Comut) é a maneira mais acessível de procurar esses periódicos. O Comut trata-se da disponibilização de capítulos e páginas de periódicos e documentos antigos e raros que se encontram no formato impresso.
Um dos portais de periódicos online que possibilita a comunicação entre pesquisadores é o da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). A iniciativa brasileira, única no mundo, surgiu em 2000. O objetivo é reunir o maior número de fontes, artigos, dissertações, teses e outros tipos de trabalhos científicos para torná-los públicos no ambiente virtual. Assim, os textos podem ser acessados por pesquisadores, estudantes e professores.
A UFSM é uma das universidades que tem uma Biblioteca Base (BC) e é vinculada ao Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), órgão oficial de banco de dados de pesquisas científicas, responsável pela disseminação e acesso à informação. Há um acervo grande e especializado em biblioteconomia, ciência da informação e áreas correlatas, e formado por monografias, publicações, anais de eventos, relatórios de teses, documentos e capítulos de livros. Alguns periódicos presentes no Portal da Capes são mais recentes e geralmente disponíveis em formato digital. Porém, é possível também localizar obras raras e antigas que ainda estão na forma impressa, dentro das bibliotecas e instituições responsáveis pelos os periódicos, podendo solicitar o serviço de comutação. As bibliotecas vinculadas ao IBICT contribuem e auxiliam a comunidade científica na difusão do conhecimento.
O que é e como utilizar o Comut?
Na UFSM, a comutação está sob responsabilidade do Setor de Referência da Biblioteca Central (Sere-Prograd), voltado para o atendimento ao público interno ou externo e trabalha principalmente com a orientação para pesquisa a partir de normas, instruções metodológicas científicas, base de dados e o processo de comutação bibliográfica. Deisiré Lobo, chefe do Setor de Referências desde 2017, explica que não são todos os interessados em acessar artigos científicos que têm vínculos institucionais com universidades e institutos de pesquisa e ter acesso ao Portal de Periódicos da Capes. Além disso, há carência de muitos periódicos não digitalizados. Assim, o Comut é uma maneira de os pesquisadores acessarem o acervo de diversas Bibliotecas Bases do país, o que contempla o acesso a obras raras e antigas.
“Temos periódicos raros que ainda não tratamos, que não registramos e que são do século passado”, afirma Deisiré. Existem dois catálogos que possibilitam que o pesquisador ou pesquisadora encontre em qual biblioteca e instituição está o texto que procura. O primeiro, no âmbito interno da Universidade, é o Serviço de Descoberta do Sistema de Bibliotecas, também conhecido como EDS (Discover Service – Serviço de Descoberta) ou pela Pesquisa de Acervo do Portal da Biblioteca UFSM. A segunda forma de consultar o título desejado é em nível nacional, por meio do Catálogo Coletivo Nacional (CNN), gerenciado pelo IBICT.
Após a localização do periódico na instituição responsável, é possível solicitar a comutação bibliográfica. É preciso entrar em contato com a Biblioteca Base em que está o texto e solicitá-lo a partir do título, autor, ano e páginas ou capítulos. O Comut está atrelado à responsabilidade do direito autoral e, por isso, não é possível ter uma obra inteira digitalizada, somente capítulos ou partes dos documentos. Luciano Rapetti, bibliotecário da UFSM e responsável pelo serviço de comutação, diz que essa movimentação também se trata de uma relação de contato entre o interessado e a biblioteca. Qualquer usuário que fizer o contato pelo comut@ufsm.br, com a devida identificação, pode indicar o periódico desejado. Depois, os servidores da Biblioteca Central localizam a obra, escaneiam as páginas solicitadas, digitalizam os materiais e fazem o encaminhamento.
Deisiré afirma que o serviço de comutação bibliográfica é realizado em várias Bibliotecas Bases vinculadas ao IBICT, mas que também se configura como uma prática mundial. O Setor de Referência atende, em sua maioria, alunos de pós-graduação, além de professores da UFSM e de outras instituições. Poucos graduandos procuram o serviço, também por não saber da possibilidade. Outras instituições de ensino podem ter acesso e solicitar o Comut das obras. Como afirma Luciano, existe uma relação de troca com outras instituições, como a Universidade de São Paulo (USP) e a Pontifícia Universidade Católica (PUC). No entanto, em 2018, houve o corte da “busca internacional”, opção que possibilitava o pedido de comutação de obras estrangeiras em instituições que têm bibliotecas com Comut, ou seja, as bibliotecas brasileiras não podem solicitar o serviço para outras instituições estrangeiras. Apesar disso, instituições estrangeiras podem solicitar a comutação de obras nacionais. Por exemplo, houve uma solicitação de Comut da Biblioteca de Washington (EUA) atendida pela Biblioteca Central da UFSM. Não há previsão para a retomada do serviço de “busca internacional”.
Os periódicos disponíveis tiveram um custo de produção tanto por parte dos pesquisadores e pesquisadoras e instituições vinculadas, quanto das editoras no processo de publicação e comprometimento com direitos autorais. É padrão da comunicação científica de ponta que haja cobrança pelos acessos a material. O valor cobrado é de R$2,20 a cada cinco páginas, independentemente do periódico. O dinheiro não é direcionado às bibliotecas, mas ao IBICT, que convencionou um valor para o número de cópias e gera uma Guia de Recolhimento de Receitas da União (GRU). Para quem possui vínculo com a UFSM, o serviço é gratuito. Deisiré afirma: “O Comut faz o resgate histórico da comunicação científica e da ciência em si, e coloca pesquisadores atuais frente à pesquisas antigas, que não estão no formato eletrônico ou na web.”
Pandemia, bibliotecas fechadas e ciclos de capacitação
A chefe do Setor de Referência comenta que um dos maiores desafios é divulgar a existência do Comut e sanar as dúvidas a respeito do processo de solicitação e acesso de documentos e periódicos. Com a pandemia da Covid-19 e o isolamento social, a Biblioteca Central passou a trabalhar de forma remota. Luciano lembra que, mesmo assim, a pesquisa nacional não parou e não pode parar, o que justifica a continuidade do Comut. Isso exigiu do bibliotecário conferir diariamente as solicitações via e-mail e ir de forma presencial na biblioteca para digitalizar os textos. Os servidores da Biblioteca Central observaram um crescimento nas solicitações de Comut quanto à procura de pesquisas de natureza de estudos de revisão sistemática, integrativa, cienciométrica (estudo dos aspectos quantitativos da ciência enquanto uma disciplina ou atividade econômica), com foco em documentos e produções científicas. Há uma busca, por parte da BC, na compreensão do quanto e do que se pesquisa sobre determinado tema em um período, o que há de publicações sobre a temática específica e em que lugar se encontram, para, dessa forma, enriquecer o catálogo com títulos considerados relevantes para aquele período. Deisiré afirma que a busca de formas de combate ao vírus exigiu dos pesquisadores o contato com as fontes primárias, ou seja, os títulos e exemplares impressos que estão nas bibliotecas fechadas.
O Setor de Referência e a Biblioteca Central utilizaram o período pandêmico para a criação do Ciclo de Capacitações Virtuais das Bibliotecas da UFSM, cuja formação mais recente foi em maio de 2021. A finalidade é sanar dúvidas acerca do setor e do Comut, facilitar o acesso dos pesquisadores interessados, capacitar novos pesquisadores e incentivar a busca por referências bibliográficas do acervo. De maneira virtual e pública, contou com a participação de editores-chefes científicos responsáveis pelas bases de dados especializadas, visando alcançar o maior número de pessoas entre pesquisadores, alunos de outras universidades e qualquer interessado por escrita científica. Os ciclos de capacitação ocorreram em meio à pandemia e possibilitaram a triplicação dos acessos e pedidos de comutação na UFSM, segundo Deisiré.