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Suicídio e traumas de infância

Grupo de psiquiatras aponta relação entre adversidades na infância e posterior comportamento suicida



Um artigo científico publicado na revista online Plos One busca compreender se traumas ocorridos na infância podem ter relação com tentativas de suicídio na vida adulta. O estudo intitulado “Do Childhood Adversities Predict Suicidality? Findings from the General Population of the Metropolitan Area of São Paulo, Brazil” foi realizado por psiquiatras da  Universidade de São Paulo (USP); do Instituto Mexicano de Psiquiatria (IMP) da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Através da trabalho, os pesquisadores chegaram à conclusão de que ter sofrido abuso físico está associado com tentativas de suicídio em todos os estágios da vida. Para chegar até essa informação, os pesquisadores se basearam nos critérios do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, publicado em 1952 pela Associação Americana de Psiquiatria, para aplicar um método de avaliação chamado “World Mental Health Composite International Diagnostic Interview (WMH-CIDI)” em uma amostra representativa de 5037 indivíduos da região metropolitana de São Paulo, que compreende a capital e outros 38 municípios.

A WMI-CIDI é uma entrevista estruturada aplicada em encontros presenciais por examinadores leigos ou profissionais. Ela é composta por duas partes: na primeira, são feitas perguntas sobre características demográficas, funcionamento diário e morbidades físicas, junto com uma avaliação diagnóstica básica de transtornos mentais (depressão maior, transtorno de pânico, transtorno de uso de drogas e comportamento suicida). A segunda parte busca mapear fatores de risco para a saúde mental, além de avaliações de transtornos adicionais.

No estudo em questão, a parte dois da entrevista foi realizada com os participantes que preencheram os critérios para qualquer transtorno mental na primeira parte. O objetivo da aplicação foi avaliar a ocorrência de comportamentos suicidas durante toda a vida, bem como a idade de início desses comportamentos. Para isso, foram considerados quatro fatores: ideação suicida na amostra total; tentativas de suicídio na amostra total; planejamento suicida entre os idealizadores e tentativas de suicídio entre os idealizadores.

Resultados

Da amostra total dos entrevistados, mais da metade (53,6%) tiveram pelo menos uma adversidade durante a infância ou a adolescência. As adversidades mais comuns entre esses indivíduos foram morte de um dos pais (16,1%) e abuso físico na infância (16,01%).  Entre os indivíduos com comportamento suicida, 73,9% tiveram adversidades na infância ou adolescência. As adversidades mais comuns nesses casos foram abuso físico (31,5 a 37,4%) e transtorno mental dos pais (22,9 a 31,4%). (A variação nas porcentagens acontece porque se fez distinção entre os indivíduos que têm apenas ideação suicida e os que têm planos, por exemplo).

Entre adultos de 20 a 29 anos, a probabilidade de uma tentativa de suicídio foi relacionada com divórcio dos pais, enquanto a ideação suicida foi associada a abuso sexual. Em adultos com mais de 30 anos, doença física e dificuldades econômicas surgiram como adversidades infantis associadas a tentativas de tirar a própria vida, enquanto que abuso sexual, violência familiar e, novamente, dificuldades econômicas foram relacionadas à ideação suicida.

Devido à pesquisa ter apontado o abuso físico como uma adversidade comum durante todos os estágios da vida, os autores sublinham no artigo que esses resultados reforçam a necessidade de se evitar métodos disciplinares violentos na infância como uma medida para a prevenção de comportamentos suicidas. Além disso, ressaltam que o resultado mais importante foi mostrar que os efeitos das adversidades para comportamentos suicidas também ocorrem de maneira indireta, por meio de doenças mentais. Isso acontece porque as adversidades são fatores de risco para essas doenças, que são algumas das principais causas de comportamentos suicidas.

Quebrando o tabu do suicídio

 

Suicídio é um tema pouco discutido na sociedade e que, consequentemente, tornou-se um tabu. O estudo feito pelos psiquiatras da USP, da UFES e do IMP é precursor em apontar relações entre traumas de infância e suicídio, uma vez que estudos anteriores (a maior parte feito em países de alta renda) fixaram-se na associação entre adversidades infantis e doenças mentais. O psiquiatra Bruno Mendonça Coêlho, da USP, um dos autores da pesquisa, atribui o fato de o suicídio ter se tornado tabu a diversos fatores. “Penso que isso ocorre por questões relacionadas ao desconhecimento do que é o suicídio (mesmo entre médicos, há estigma com pessoas que tentam suicídio — é uma certa afronta para o médico que tenta salvar vidas se deparar com alguém que tenta tirar sua vida), culturais (suicídio é crime em alguns países) e religiosas (basicamente todas as religiões condenam o suicídio)”, opina.

Organizações como o Centro de Valorização da Vida (CVV) defendem a ideia de que a melhor forma de prevenir o suicídio é justamente trazer a discussão à tona. Na cartilha dos Programas de Prevenção do Suicídio e Saúde Mental do CVV, o grupo afirma que “é preciso deixar de ter medo de falar sobre o assunto, derrubar tabus e compartilhar informações sobre o tema”. A cartilha define o suicídio como algo que faz parte da natureza humana e aponta os principais motivos que levam os indivíduos a quererem tirar a própria vida: cobranças sociais, culpa, remorso, depressão, ansiedade, medo, fracasso e humilhação. Ainda segundo a cartilha, pessoas que têm pensamentos suicidas vivem sentimentos e ideias conflituosas, o que é chamado de estado interior de ambivalência. Portanto, nesses casos, o indivíduo vive um isolamento insuportável e precisa de atenção. Daí vem a necessidade de ter alguém que possa ouvir a pessoa que está passando por essa situação, já que ter abertura para desabafar e externalizar os sentimentos conflitantes pode fazer com que se desista do suicídio.

_delimiter_Repórteres: Iander Moreira e Camila Jardim
Foto: Rafael Happke.

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