Ir para o conteúdo CE Ir para o menu CE Ir para a busca no site CE Ir para o rodapé CE
  • International
  • Acessibilidade
  • Sítios da UFSM
  • Área restrita

Aviso de Conectividade Saber Mais

Início do conteúdo

Presidente da Sociedade Brasileira de Educação Matemática ministrou palestra no CE



Regina Célia Grando participou de evento no 16B

Plano Nacional de Educação, Base Nacional Curricular e Escola sem Partido são projetos que têm movimentado as discussões sobre a educação no Brasil nos últimos três anos. Todos propõem a modificação de um modelo escolar que supostamente não funciona mais. Entretanto, para a presidente da Sociedade Brasileira de Educação Matemática (SBEM), Regina Célia Grando, não adianta esperar que uma modificação no ensino brasileiro gere resultados imediatos, como a reversão do baixo desempenho dos estudantes em exames nacionais, como a Prova Brasil e a Avaliação Nacional da Educação Básica. “O que mudamos hoje na educação só aparecerá em dez anos”, defende a doutora em Educação Matemática pela Universidade de Campinas (Unicamp).

Regina Grando é especialista em uma área considerada uma das mais problemáticas no ensino brasileiro — um estudo da ONG Todos pela Educação mostrou, em 2015, que apenas 3% dos alunos formados no Ensino Médio brasileiro dominam a disciplina. Para a professora, um dos problemas ainda é a formação do professor, que desvincula a matemática pura da prática pedagógica.

“O que temos é problema de ensino de matemática, não de aprendizagem. Eu acho que, às vezes, não é está claro para o professor determinado conteúdo, e aí ele vai trabalhar de uma maneira que não ajuda o aluno a avançar, a pensar”, afirma.

A especialista participou na manhã desta quinta-feira (4) da mesa redonda “Ensino Aprendizagem de Matemática na Educação Básica”, que integra a programação da 5ª Escola de Inverno de Educação Matemática. O evento, promovido pelos Centros de Educação (CE) e Ciências Naturais e Exatas (CCNE) continua até esta sexta-feira (5), com palestras e minicursos. Veja aqui a programação.

Na entrevista abaixo, Regina Grando apresenta um panorama sobre a educação matemática no Brasil.

 

Qual é a proposta da Sociedade Brasileira de Educação Matemática?

A SBEM está completando 30 anos no próximo ano e tem como proposta congregar, em discussão, professores da educação básica e superior, pesquisadores e estudantes. A ideia é que um conjunto de pessoas consiga repensar o ensino da matemática para todos. Acreditamos que todos são capazes de aprender matemática, mas respeitando seu tempo e sua forma de aprendizagem. 

Como a senhora avalia a formação de professores de matemática pelas universidades brasileiras?

Eu acredito muito que conseguiremos mudar se pensarmos juntos. Uma das novas diretrizes para formação de professores (CNE 002/2015) é pensar a formação inicial e continuada juntas. O que acontece com a formação inicial (licenciatura) hoje: a formação do professor de matemática ainda é muito dicotômica, ou seja, o professor ter uma formação em matemática pura, desvinculada da pedagógica. É interessante que eu começo a observar a mudança dessa formação nos institutos federais. Os IFs, por serem muito novos, criaram uma “conversa” entre essas duas partes e, além disso, o professor que atua dentro do instituto ensina desde a educação básica até o ensino superior. Agora, embora a gente reclame tanto da licenciatura em matemática e temos uma diminuição das pessoas que querem ser professores, além da altíssima evasão, se você pegar a pesquisa da professora Bernadete Gatti sobre professores no Brasil vai ver que a licenciatura em matemática ainda é a que possui maior carga de formação pedagógica, pois temos uma comunidade muito grande de educadores matemáticas.

E qual é o impacto desse distanciamento entre a ciência pura e a prática pedagógica?

O licenciando vive duas realidades completamente diferentes, pois muito do que ele ouve na Faculdade de Educação – que a aprendizagem é um processo, [a necessidade de] questionar os alunos sobre o currículo – eles vivem o contrário nos institutos de matemática. E essa dicotomia existe até hoje, até mesmo nas sociedades: temos a Sociedade Brasileira de Educação Matemática e a de Matemática.

Essa visão não é bem aceita?

Não é isso, o diálogo é há muito tempo tentado. Os próprios educadores matemáticos e alguns cursos novos que tem surgido estão ajudando nisso, mas pensa nas faculdades tradicionais, fica difícil acontecer. O objeto de estudo também é diferente: embora seja matemática, quem dá aula de prática está preocupado em ensinar o aluno a ser professor, enquanto que no instituto de matemática pretende-se que o licenciando domine o conteúdo, não tanto se aquilo faz sentido para o ensino.

Uma das metas do Plano Nacional de Educação é aumentar o índice de professores das ciências exatas (matemática, física, química e biologia) que sejam licenciados na área que lecionam. Qual o impacto de termos professores “invadindo” áreas?

Se você tem um professor de química, física ou biologia, ele demorou menos tempo aprendendo a ensinar matemática e isso vai trazer um prejuízo, mas não acho tão grave. Para mim é mais grave que um profissional que não é professor – hoje permite-se uma complementação de apenas 600 horas de didática – se torne um educador. É o engenheiro, o administrador que dá aula de matemática. Esta pessoa gastou pouco tempo aprendendo as implicações do ensino-aprendizagem. As pesquisas em ensino de matemática já mostraram há anos que apenas o domínio do conteúdo não garante o sucesso do ensino.

A ONG Todos pela Educação apresentou um estudo segundo o qual apenas 3% dos alunos formados no Ensino Médio dominam matemático. Estes índices de fato refletem o cenário que temos?

Estes índices são baseados em avaliações externas, e há um problema na avaliação do ensino, mas eles nos ajudam a pensar algumas coisas. Hoje cedo um professor veio me dizer que o problema está na formação do pedagogo, que não sabe matemática. Mas o índice mostrados pelo Todos pela Educação apontam uma redução do domínio no final do ensino fundamental e médio, então quem está errando em passar o conteúdo? Além disso, quem forma o pedagogo é o professor especialista em matemática, e somos nós que não o ensinamos. Os índices ajudam a pensar, mas eles falam muito pouco. O que houve, na verdade, foi um investimento muito forte nos anos iniciais, como o Pacto pela Idade Certa, que fizeram os professores nos anos iniciais pensar sobre o ensino e a estudarem. Estes programas traziam possibilidades, mas agora o governo acabou tudo.

O ENEM tem cobrado a matemática e as ciências exatas de forma multidisciplinar, englobando também a linguagem. Isso precisa ser adotado pelas escolas também?

Sim, mas o problema é que eu não mudo isso com uma canetada. Aí vamos para a Base Nacional Curricular (BNCC). A minha impressão é que só agora os professores começaram a compreender os Planos Curriculares Nacionais (PCNs). E a outra grande questão é que quando temos grandes projetos da educação, como foi o Observatório Nacional de Educação (Obeduc), temos pessoas que não são educadores trabalhando em projetos, e elas não entendem que o que mudamos hoje só aparece na educação em dez anos. É preciso trabalhar a fixação de professores e diminuir a questão burocrática, por exemplo, que é de longe o que mais estressa o professor. Há muita exigência para além do trabalho com os alunos. É por isso que a escola faz a diferença: o bom gestor trabalha para que isso não sobrecarregue o professor. Todas as políticas, como BNCC, Plano Nacional de Educação, são coisas que vamos fazer agora, mas que vai demorar 10, 15 anos para vermos algum resultado.

Como o aluno brasileiro vê matemática?

Eles adoram matemática. O que temos é problema de ensino de matemática, não de aprendizagem. Eu acho que, às vezes, não é claro para o professor determinado conteúdo, e aí ele vai trabalhar de uma maneira que não ajuda o aluno a avançar, a pensar. E aí você tem uma carga imensa de conteúdo, e trabalhar a reflexão sobre aquele assunto vai gerar um suposto atraso. A avaliação externa é muito perversa, cobra conteúdos que às vezes ainda não foram ministrados, e isso vai frustrando, acabando com o desejo de continuar professor. A gente que trabalha com o professor que está na escola vemos que é muito difícil se manter na profissão. E aí vem um projeto como o Escola sem Partido que vai nos retirar 50 anos de avanço. A educação não estava boa, mas estava caminhando.

Por que o projeto é retrógrado?

É não formar um sujeito que pensa e achar que o aluno é burro, que não sabe tomar um posicionamento do que ouve. A maneira como eu conduzo o meu ensino é política, e eu não estou falando de partido, mas de ideologia.

Professora Regina Grando (à esquerda) e Anemari Lopes, do Departamento de Metodologia de Ensino do Centro de Educação (à direita).

Divulgue este conteúdo:
https://ufsm.br/r-373-223

Publicações Relacionadas

Publicações Recentes