
Reportagem e redação: Isadora Juliatto Piovesan
Em 2014, foi instituído pelo Governo Estadual o primeiro corredor ecológico do Rio Grande do Sul, o Corredor Ecológico da Quarta Colônia (CEQC). A iniciativa foi pensada como uma ferramenta de conservação que busca propiciar condições adequadas para o deslocamento de animais, a dispersão de sementes e promover a conectividade entre fragmentos de vegetação natural. O corredor atualmente abrange áreas de importante preservação, como o Parque Estadual da Quarta Colônia, a Reserva Biológica do Ibicuí Mirim e o Parque Natural Municipal de Sobradinho.
Há mais de 10 anos de sua criação, a importância destas áreas de preservação tem se tornado cada vez mais evidente. Com eventos climáticos extremos acontecendo com mais frequência, como as enchentes de 2024, a região vem sendo cada vez mais atingida. Entre enchentes, deslizamentos e outros estragos, diversos agricultores e a biodiversidade da região foram gravemente atingidos. Pensando neste impacto, o Núcleo de Estudos e Pesquisas em Recuperação de Áreas Degradadas (NEPRADE) da Universidade Federal de Santa Maria, vinculado ao Departamento de Ciências Florestais da UFSM, iniciou o projeto Restauração Ecológica e Inclusão Social no Corredor Ecológico da Quarta Colônia.

Mais conhecido como Restaura CEQC, o projeto tem como objetivo fortalecer os benefícios do Corredor por meio da restauração ecológica. Para isso, os pesquisadores e estudantes da UFSM atuam em conjunto com agricultores da região para a implementação de agroflorestas. De acordo com a professora do Departamento de Ciências Florestais e coordenadora do projeto, Ana Paula Rovedder, a prática de implantação de agroflorestas é uma ferramenta de restauração de ecossistemas praticada globalmente. Entretanto, para a aplicação na Quarta Colônia, o grupo utilizou adaptações para a realidade da região. Segundo ela, foi implementada uma técnica de restauração produtiva, ou seja, além de restaurar o solo, a biodiversidade, paisagem e recarga hídrica, processo natural de reposição da água subterrânea, ela também é um procedimento que permite produzir grãos, frutas ou qualquer outro tipo de alimento que o produtor rural tenha interesse.
Para que o Corredor se torne uma agrofloresta restaurativa é essencial que tenha algumas características, como biodiversidade, o que significa que é necessária uma variedade grande de espécies nativas da região da Quarta Colônia, podendo também conter espécies externas e não invasoras de acordo com as necessidades dos agricultores. Dessa forma, as agroflorestas podem conservar e restaurar a biodiversidade da região mas também serem utilizadas como uma ferramenta de segurança alimentar para as famílias beneficiadas. Ana Paula ainda explica que a prática favorece a economia local: “Ele atua no campo da segurança alimentar e também na questão econômica, porque os produtos produzidos podem ser comercializados; como são geralmente alimentos, eles são comercializados em em cadeias curtas, regionais e locais”.

Muvuca de sementes
Para colocar a pesquisa em prática, a primeira ação do projeto aconteceu em 22 de outubro de 2024 com a chamada Muvuca de Sementes. Realizada em Agudo, a ação foi inspirada em práticas de cultura de grão indígenas que consiste em espalhar sementes em um solo previamente preparado. A iniciativa ocorreu em parceria com o Ibama, o Centro de Pesquisa em Florestas, Parque Estadual da Quarta Colônia, Corredor Ecológico da Quarta Colônia, TAESA S.A e Rede Sul de Restauração Ecológica. De acordo com a coordenadora, o Muvuca de Sementes não estava previsto no projeto original e foi uma adaptação do Projeto Restaura CEQC em razão da realidade encontrada após o desastre climático. “Foi uma adaptação que nós fizemos para motivar a população regional e mostrar que há possibilidades de se trabalhar a resiliência climática, a qualidade de vida e a manutenção das matas ciliares”, explica.
A ação, que é a primeira realizada no Rio Grande do Sul, aconteceu na propriedade de um dos parceiros do projeto que havia sido extremamente afetada pelas enchentes. A região, antes do desastre climático, possuía uma mata ciliar conservada que foi completamente destruída pelas enchentes. Por conta disso, o depósito das sementes foi essencial para recuperar também o solo da região, que havia sido totalmente perdido, tendo sobrado somente o depósito da enchente. Ana Paula ainda conta que a área continua sendo estudada pelos pesquisadores do Neprade e que mês a mês a equipe vem observando resultados favoráveis de desenvolvimento das espécies florestais e adubos verdes, trazendo de volta vida e biodiversidade para a região.