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A exaustão algorítmica e o jornalista metrificado no trabalho em plataformas



Paola Jung

Nesse primeiro texto publicado em 2024, convido vocês a realizarem uma reflexão a respeito da influência dos algoritmos e das métricas nas relações de trabalho tanto dentro quanto em relação às plataformas. Para tecer a discussão, pensarei na ligação entre influencers e jornalistas no trabalho em plataforma, através dos textos: “Exaustão algorítmica: influenciadores digitais, trabalho em plataforma e saúde mental” de Issaaf Karhawi e Michelle Prazeres; e “Jornalistas Metrificados: valores profissionais conflitantes no ambiente de plataformização e lógica neoliberal”, de Janaína Kalsing e Ana Cláudia Gruszynski.  

O texto da exaustão algorítmica articula questões de tempo, tecnologia, trabalho, saúde mental e influenciadores digitais, já o segundo texto, sobre jornalistas metrificados, demonstra questões como plataformização, valores jornalísticos, métricas, trabalho e empreendedorismo de si. Apesar de terem problemáticas distintas, ambos trazem questões relacionadas ao trabalho plataformizado e às lógicas neoliberais e as consequências dele em diferentes aspectos da vida desse trabalhador analisado,seja ele jornalista ou influencer. 

Primeiramente, é importante compreender que a forma como experimentamos e compreendemos a tecnologia está intrinsicamente ligada ao Vale do Silício, que detém poder material, financeiro e simbólico sobre a mesma. (Karhawi; Prazeres, 2022, apud Morozov, 2018) Neste momento vamos focar mais exclusivamente nas plataformas, porém cabe ressaltar que esse domínio das também chamadas Big Five vai muito além disso. 

A partir disso, vamos considerar as plataformas e a sua forma de governança, os algoritmos que regem o seu funcionamento em uma lógica de capitalismo de plataforma, na qual existem regras de produtividade e penalidade para certos comportamentos. Quem segue as regras (as quais estão em constante mudança) será recompensado, quem não consegue acompanhar ou se recusa por qualquer motivo, será penalizado com menos entrega do seu conteúdo para os usuários e consequentemente menos engajamento que geraria monetização para o criador. 

Nesse sentido, os trabalhadores de plataforma, ou seja, as pessoas que utilizam as plataformas como uma forma de sustento, possuem o seu trabalho quantificado por métricas, que é a atribuição de valor às novas moedas correntes nos meios digitais (atenção, dados, usuários e dinheiro) e a seleção orientada para o usuário e pelo algoritmo (Karhawi e Prazers, 2022, apud Vallas e Schor, 2020). 

A discussão levantada por Karhawi e Prazeres (2022) aponta que os influencers, que são um dos exemplos de trabalhadores de plataforma, acabam adoecendo principalmente com doenças como depressão e burnout, por conta dessa lógica exarcebada de produção, que exige do criador uma presença constante em todas as plataformas, produzindo conteúdo em diversos formatos. No texto, as autoras falam sobre esse empreendedorismo de si, sobre trocar um chefe de carne e osso por outro que não tem uma forma específica, mas ainda sim os põem em uma lógica cruel de trabalho que não tem início nem fim de sua jornada: 

“O algoritmo parece como uma espécie de materialização, algo que dá nome à opacidade das redes, ‘alguém’ para quem se endereça a indignação. Não se trata de um esgotamento sem causa evidente, uma ansiedade generalizada para a qual não se dá nome, mas uma exaustão que se deriva da conformação das plataformas, da interferência na quantidade e na qualidade da produção de conteúdo nos limites impostos ao prazer e à criatividade por conta de uma lógica dataficada. O esgotamento que se articula aponta para uma ‘exaustão algorítmica’”. (Kawhawi; Prazeres, 2022, p. 13)

Trazendo essa problemática para o jornalismo, Kalsing e Gruszyski (2021) trouxeram em seus estudos entrevistas realizadas com jornalistas que atuam no meio digital, a fim de verificar como o uso de métricas afeta tanto no seu trabalho cotidiano quanto nos valores-notícia e nos valores do próprio profissional. Os relatos demonstram que os jornalistas estão sendo medidos pelos seus superiores através das métricas das suas matérias, e quanto melhor forem as suas métricas, mais chances eles possuem de subir na carreira. 

Através desta preocupação constante com as métricas, os jornalistas muitas vezes precisam priorizar títulos caça-cliques e pautas que geram engajamento em detrimento daquelas que fariam sentido baseado nos valores-notícia, apesar de que esta última também é levada em consideração quando o veículo não está desesperado para bater a meta de cliques mensais: 

“O uso de métricas aponta para uma série de embates, tendo em vista que a realidade dos profissionais conflita com o que desejam e almejam do jornalismo e da profissão. Não há regras claras sobre quais assuntos priorizar nas redações, ‘vai muito do momento’, sinaliza Rafael (2020). Se algo se mostra como muito relevante, isso ‘não vai ser menosprezado’ e receberá o devido destaque. Mas ao mesmo tempo, se ‘tu está muito mal de audiência’, pautas que possam gerar clique e trazer ‘dinheiro’ para o site também recebem prioridade. Para o jornalista, esse tipo de conteúdo ‘passa por cima do valor do interesse público, da credibilidade, da seriedade com a informação. Ela [a pauta orientada por métrica] passa por cima. Ela atropela porque ela é a necessidade imediata, tem que fazer, tem que ter audiência.’”. (Kalsing; Gruszynski, 2021, p.8)

Por fim, a reflexão que trago para esse texto é a de que o trabalho plataformizado não é difícil apenas para quem trabalha sozinho com a plataforma, mas também para quem está apoiado em uma instituição, como os jornalistas trabalhando em empresas jornalísticas tradicionais. Mesmo estas instituições estão sendo guiadas pelas métricas e pelas normas dos algoritmos, fazendo com que jornalistas não possam mais atuar apenas baseados nos valores jornalísticos. Os algoritmos agem de forma transversal dentro das plataformas, o que cria uma lógica perversa de produtividade que altera as lógicas de trabalho tanto para quem depende apenas das plataformas quanto para as instituições que necessitam delas para circular os seus conteúdos. 

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