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DEMOCRACIA PARTICIPATIVA E STF: LIMITES E DESAFIOS DAS AUDIÊNCIAS PÚBLICAS COMO PROMOTORAS DE LEGITIMAÇÃO DEMOCRÁTICA

Vanessa Müller – vanessamulleradv@gmail.com

Orientadora: Drª. Nina Trícia Disconzi Rodrigues Pigato

Coorientadora: Drª. Cristiane Catarina Fagundes de Oliveira

 

A pesquisa realizada se baseou na ideia de que a democracia pode ser definida como “governo do povo”, entendida como o regime de governo em que o povo — no caso os cidadãos — podem tomar decisões políticas, por meio de representação ou diretamente, com mecanismos constitucionais e legais que garantem a participação popular na esfera pública, seja no Poder Executivo, Legislativo ou Judiciário.

A partir do processo de redemocratização brasileiro ocorrido na década de 80 e da Constituição em 1988, houve uma gradual ampliação do papel do Supremo Tribunal Federal (STF) como órgão jurisdicional máximo em âmbito nacional.

A fim de harmonizar as atribuições conferidas ao STF com os princípios democráticos, possibilitou-se que durante os processos houvesse o exercício da democracia participativa por meio da realização de audiências públicas, ocasião em que é atribuída a representantes da sociedade civis (na condição de especialistas sobre temas técnicos) a possibilidade de participar do mecanismo de tomada de decisão a respeito de matérias de interesse público, objeto das demandas judiciais apresentadas. Essa prática, aliada às tecnologias de informação e comunicação atualmente colocadas à disposição do órgão constitucional, teria o condão de aperfeiçoar a participação democrática no Poder Judiciário.

Objetivou-se, assim, explorar o problema da definição da democracia; apresentar o desenvolvimento das teorias democráticas até o advento da democracia participativa; argumentar sobre os pressupostos da ampliação dos poderes do Supremo Tribunal Federal quanto ao controle concentrado de constitucionalidade; discutir a utilização das tecnologias de informação e comunicação (TICs) no ambiente judicial; para, por fim, realizar um estudo qualitativo e quantitativo da operacionalização empírica dessas por meio das técnicas político-jurídicas já colocadas à disposição dos diversos atores sociais envolvidos de modo a responder ao seguinte questionamento: em que medida as audiências públicas são promotoras de legitimação democrática?

Passou-se, a partir de então, a refletir sobre a relação entre a participação da sociedade e o que ocorre durante as audiências públicas no âmbito do Supremo Tribunal Federal, durante as ações de controle de constitucionalidade de normas e atos provenientes dos poderes Executivo e Legislativo. Apoiado pela legislação infraconstitucional e pelo seu Regimento Interno determinou-se ao STF a realização de audiências públicas com a oitiva de experts com o evidente intento de pluralizar o debate na Corte Constitucional brasileira.

Todavia, por mais que haja interesse em concretiza-las, tendo em vista as vinte e nove audiências realizadas entre 2007 e a sua suspensão decorrente da pandemia em 2020 (período analisado na pesquisa), não se constata a existência de participação popular como buscada na democracia participativa: livre e aberta ao diálogo entre os atores sociais envolvidos.

Vários fatores afetam esse questionamento, os quais reduzem a legitimidade das ações do Supremo. Inicialmente, constata-se a necessidade de um refinamento dos mecanismos de convocação, os quais não demonstram clareza e transparência, principalmente no que diz respeito aos critérios de habilitação e admissibilidade para a participação nas audiências públicas. Há obscuridade na sua seleção, ou seja, pouca transparência na forma de classificação dos habilitados a se manifestarem, além de não permitirem a sua impugnação.

Outro ponto deficitário presente na estrutura organizacional das audiências públicas é a disposição dos lugares dos atores sociais e a impossibilidade de manifestação da plateia presente, além da nítida apresentação opositiva entre os grupos com ideias contraria. Não se constata a existência de um debate ou um diálogo construtivo; tem-se, ao contrário, lados opostos que se digladiam para verificar quem vencerá ao final. Diante da ausência de diálogo e interação construtiva entre os participantes de audiências pré-decisionais, toda a sociedade perde. Busca-se, portanto, tanto o aprimoramento do momento da troca de argumentos, quanto a maneira como esses expositores devem participar, de forma a se obter a evolução dessa ferramenta constitucional.

Da mesma forma, percebe-se que há um individualismo em diversos julgamentos, que se desvirtuam do intento inicialmente proposto: as audiências devem ser utilizadas como fundamento técnico para as decisões do Colegiado, ao qual é intrínseco o dever de produzir decisões unitárias e condizentes com os princípios norteadores do direito durante a fase decisional. Mesmo havendo divergências, essas devem ser esclarecidas, apontadas e respeitadas, sob pena de decréscimo da legitimidade dos seus julgamentos.

O presente trabalho intencionou também constatar as dificuldades com vista, senão à solução dos problemas, ao menos à superação dos obstáculos contornáveis. Isso significa que serão necessários novos ajustes, novas visões e novos posicionamentos do próprio STF, como responsável pelo exercício do controle de constitucionalidade e garantidor dos princípios constitucionais. Destaca-se a necessidade de uma maior conscientização dos Ministros quanto à importância do diálogo e da troca de visões entre os pares, deixando de lado o individualismo em prol do espirito de deliberação.

Também se torna fundamental a valorização das audiências públicas pelo que elas representam: a busca de maiores elucidações através da escuta de especialistas nas questões colocadas em discussão, sobre as quais os Ministros não possuem um profundo conhecimento. Isso, por si só, já traria resultados positivos e favoráveis aos anseios da sociedade, atualmente desacreditada nas instituições.

Se a esses pontos for somada uma alteração no seu regimento interno, de forma a incluir regras de maior transparência quanto à habilitação de manifestantes, de utilização das TICs e de aprofundamentos dos debates — tanto com os experts e quanto com os pares — as implicações seriam não somente uma maior celeridade nos processos, como certamente um aumento da legitimidade das decisões proferidas. Porém, urge agilidade para que tais mudanças ocorram, uma vez que diante das transformações constantes na sociedade provenientes da rápida evolução do mundo digital, também são necessárias adaptações mais ágeis nas instituições para que propiciem uma maior participação social.