Ir para o conteúdo Revista Arco Ir para o menu Revista Arco Ir para a busca no site Revista Arco Ir para o rodapé Revista Arco
  • International
  • Acessibilidade
  • Sítios da UFSM
  • Área restrita

Aviso de Conectividade Saber Mais

Início do conteúdo

Crise brasileira

Economista José Luis Oreiro fala das expectativas econômicas para o Brasil



O professor José Luis Oreiro, membro do Departamento de Economia da Universidade de Brasília, esteve na UFSM participando do ciclo de palestras “Caminhos do Saber”. Ele, que é mestre e doutor em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, foca sua pesquisa na acumulação de capital, crescimento econômico, autonomia de política monetária e taxas de juro.

 

A Arco aproveitou a passagem do professor e conversou com ele sobre o momento atual do país. Diante da crise econômica e política do Brasil, Oreiro falou dos possíveis caminhos para fugirmos do aumento da inflação e da desindustrialização. Além disso, ele ressaltou a importância do ajuste fiscal, cortando gastos e aumentando a receita, já que a dívida pública ultrapassa 2,5 trilhões de reais.

 

Confira abaixo nossa entrevista.

 

Professor, primeiramente, quais são os principais motivos que nos levaram a chegar à situação econômica que enfrentamos hoje?

A crise econômica brasileira é a união de uma redução do potencial de crescimento da economia devido à desindustrialização e à predominância de bens primários na exportação, com uma “tempestade perfeita” composta pela deterioração dos termos de troca a partir de 2013, que é a relação entre preços dos produtos exportados e preços dos importados, o que reduziu o valor das exportações; aceleração da inflação entre 2014 e 2015, o que resultou numa grande redução da renda real do trabalho e levou o Banco Central a elevar a taxa de juros, o que terminou por produzir uma redução dos gastos de consumo; efeitos da operação Lava-Jato sobre os contratos e investimentos da Petrobras, o que contribuiu para a redução da formação bruta de capital fixo, dado que a Petrobras responde por aproximadamente 10% do investimento realizado no Brasil; e, por fim, a crise política que culminou com o impeachment da presidente Dilma aumentou a incerteza percebida no ambiente econômico levando os empresários a postergar gastos de investimento. Dessa forma, a semi-estagnação observada entre 2012 e 2013 devido à redução do potencial de crescimento se transformou numa forte recessão em 2015.   

 

Há tendência para retomada da economia? Caso não, qual solução o senhor enxerga para voltarmos a crescer?

No primeiro trimestre de 2016, começaram a aparecer os primeiros sinais de que o processo de queda do nível de atividade econômica está perdendo força. As exportações de produtos manufaturados, produzidos em grande quantidade, estão aumentando, reflexo do ganho de competitividade das exportações em função da forte desvalorização da taxa de câmbio ocorrida em 2015. A inflação acumulada em 12 meses também está se reduzindo, o que ajuda a estabilizar a renda real dos trabalhadores. Por fim, temos um novo governo e uma nova equipe econômica o que deve ajudar, ainda que marginalmente, na melhoria do estado de confiança dos empresários e dos consumidores. Nesse contexto, acredito que o nível de atividade econômica irá se estabilizar – ou seja, parar de cair – na passagem do primeiro para o segundo semestre de 2016.

 

A projeção do FMI para 2016 é de que o PIB brasileiro sofra retração de 3,5%. Como isso reflete na vida do cidadão brasileiro?

A consequência inevitável é o aumento da taxa de desemprego. Atualmente existem quase 11 milhões de desempregados no Brasil. Como o mercado de trabalho responde mais lentamente do que o nível de produção a uma queda da demanda agregada, eu acredito que o desemprego continuará aumentando por muito tempo após a estabilização do nível de atividade econômica. É possível que no final de 2016 o número de desempregados no Brasil chegue ao contingente de 13 milhões de pessoas ou 13% da força de trabalho.

 

Muitos economistas e políticos citam o ajuste fiscal como solução. O que isso significa?

O ajuste fiscal é absolutamente necessário para reverter a trajetória de crescimento da dívida pública como proporção do PIB. No momento a dívida pública está numa trajetória que é insustentável no médio e longo prazo, o que pode levar o Estado Brasileiro à situação de falência. Se isso ocorrer, o Banco Central será obrigado por força das circunstâncias a realizar a monetização dos déficits públicos, ou seja, a imprimir dinheiro para pagar o excesso de gastos sobre arrecadação. Se isso acontecer, o Brasil voltará ao passado inglório de inflação alta e persistente, como o que ocorria antes do Plano Real.

 

 

A crise econômica está diretamente ligada à crise política?

Com certeza. Se a economia estivesse apresentado uma performance razoável, a popularidade da Presidente Dilma não teria caído tanto, tornando inviável qualquer tentativa de impeachment. Mas é preciso deixar claro que a crise econômica é condição necessária, mas não suficiente, para um impeachment. O Brasil viveu uma crise econômica bastante forte em 1998-1999 mas nem por isso ocorreu o impeachment do presidente Fernando Henrique Cardoso.

 

“Mas é preciso deixar claro que a crise econômica é condição necessária, mas não suficiente, para um impeachment”

 

Na sua palestra, o senhor fala sobre a situação de recessão e depressão, sendo a primeira a que enfrentamos no momento. O que determina que entremos em depressão? Qual a diferença entre os dois estados?

A depressão ocorre quando a queda do nível de atividade econômica é grande o suficiente para afetar a solidez do balanço dos bancos e instituições financeiras. Se isso ocorrer o governo será obrigado a intervir no sistema bancário como ocorreu em países como os Estados Unidos e a Espanha. Torço e espero para que isso não ocorra no Brasil.

 

A aceleração da inflação faz com que os consumidores passem a retrair seu consumo, o que ocasiona a queda da economia. Como sair deste ciclo?

A recuperação da economia brasileira será o resultado do aumento das exportações de manufaturados devido ao câmbio mais competitivo e à redução da taxa de juros que deverá ter início no segundo semestre de 2016. A redução dos juros levará os bancos a aumentar gradualmente a oferta de crédito, permitindo assim um aumento da demanda por bens de consumo duráveis. Não devemos esperar por um aumento do investimento privado neste momento, uma vez que a economia brasileira se encontra com uma grande capacidade ociosa. Dessa forma, a recuperação virá por intermédio das exportações e pelo aumento do consumo de bens duráveis que se seguirá a redução da taxa de juros.

 

Até 1999, o Brasil tinha como característica um percentual muito maior de exportação de produtos manufaturados do que tem hoje, já que passamos a ser exportadores essencialmente de commodities. As exportações de manufaturados têm um valor agregado muito maior, no entanto até aquela data esse incremento de valor não se refletia num desenvolvimento econômico e social distribuído de forma homogênea para o país. Por quê?

A distribuição de renda no Brasil reflete dois fatores. Em primeiro lugar, a participação dos salários na renda nacional é muito baixa. Como os que vivem de salários são muito mais numerosos do que os que vivem de outras rendas, segue-se que a distribuição de renda só por esse motivo tende a ser muito concentrada. Em segundo lugar, dentro da parcela de renda que é apropriada na forma de salários existe muita desigualdade, ou seja, a diferença entre os salários mais altos e os salários mais baixos é muito grande. A única forma de aumentar de forma sustentável a participação dos salários na renda nacional ao mesmo tempo em que se reduz a desigualdade salarial é por intermédio do aumento da qualificação da força de trabalho, o que exige maciços investimentos em educação. Ora, o Brasil é historicamente deficiente nisso. Nos últimos anos houve alguma melhora nesse quesito, mas os sucessivos governos do PT optaram por forçar um aumento da participação dos salários na renda por intermédio de politicas que induzissem os salários reais a crescer acima da produtividade do trabalho. Essas políticas são insustentáveis no longo-prazo, porque geram inflação no setor de bens não-transacionáveis e esmagamento de lucros no setor de bens transacionáveis.

Reportagem: Andressa Foggiato
Fotografias: Rafael Happke

Divulgue este conteúdo:
https://ufsm.br/r-601-295

Publicações Relacionadas

Publicações Recentes