Em 15 anos, o Projeto Fórmula, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), consolidou-se como um dos mais completos e respeitados ambientes de aprendizagem prática da instituição. Voltado para engenharia automotiva, o projeto alia paixão, conhecimento técnico e espírito de equipe na construção de carros do padrão Fórmula, preparados para competir em uma das mais desafiadoras provas universitárias do país.
No coração do Centro de Tecnologia da UFSM (CT), o ronco do motor e o som das ferramentas marcam a rotina de uma equipe que vive automobilismo. Com apoio direto de professores do CT, o projeto permite que estudantes desenvolvam, do zero, veículos de competição com estrutura semelhante aos modelos da Fórmula 1 – ou seja, um veículo leve, aerodinâmico, com chassi exposto, rodas abertas e desenvolvido para alta performance em pistas.
A equipe representa a universidade na Fórmula SAE Brasil, competição que reúne anualmente cerca de 45 times de todo o país, divididos nas categorias:
- Combustão: carros com motor a combustão interna, geralmente movidos a gasolina;
- Elétrica: carros com motorização elétrica, que seguem regras específicas de segurança e desempenho.
O Fórmula UFSM compete na categoria combustão e, desde 2018, figura entre os cinco melhores colocados, conquistando o 4º lugar geral no ano passado. O protótipo FU-25, batizado de Ares, representará a UFSM na Fórmula SAE Brasil 2025, entre os dias 30 de julho e 3 de agosto, em Piracicaba (SP). Projetado para ser o carro mais veloz, leve e eficiente da história da equipe, o Ares incorpora inovações como novas geometrias de suspensão, peças usinadas em alumínio e sistemas eletrônicos aprimorados. Seu grande diferencial está na validação: foram mais de cem dias de testes rigorosos.
Para Gabriel Mainardi, estudante do 5º semestre de Engenharia Mecânica, o projeto é a concretização de um sonho. Apaixonado por automobilismo desde o ensino técnico, ele entrou para o Fórmula em 2023 e hoje atua como Diretor Técnico da equipe. “Aqui, aprendemos da mesma forma que na indústria. Desde a pesquisa até a fabricação, tudo é feito por nós, sempre com apoio dos professores”, afirma.
O planejamento do carro, renovado a cada ano, tem início poucos dias após o fim da competição. “Tiramos uma semana de descanso e então iniciamos a fase de análises. Depois vem o design detalhado, todo feito em software de modelagem”, explica Mainardi. O modelo de 2025 começou a ser construído no final de dezembro e já estava rodando no início de abril.
Os professores possuem papel central na orientação. Mario Martins, fundador e coordenador do projeto, atua nas áreas de motor, transmissão e suspensão. Sob sua coordenação, a equipe foi selecionada duas vezes para correr nos Estados Unidos, em 2013 e 2015, na cidade de Lincoln. “Quem acompanha nossa trajetória vê uma diferença grande. Nosso trabalho é um trabalho de engenharia, primamos pela excelência. Estamos sempre nas primeiras posições, lutando com os melhores”, afirma. Já Ronaldo Glufke, do curso de Desenho Industrial, contribui com a identidade visual. Ele ressalta: “O carro é pensado desde a estética até a funcionalidade. Cada detalhe é planejado”.
O professor Fernando Baier cuida da parte elétrica e eletrônica, enquanto Roberto Hausen, pesquisador do Grupo de Pesquisas em Motores, atua diretamente na fabricação e montagem dos componentes. “É um projeto que simula a indústria, mas também é uma escola. A didática da universidade está completamente integrada aqui”, afirma. Para Cesar dos Santos, coordenador do curso de Engenharia Mecânica, o Fórmula UFSM é um projeto completo em termos de formação profissional: “É um projeto de aplicação real, no qual o aluno desenvolve capacidades técnicas, de gestão, de equipe e de liderança. Isso faz com que eles estejam vários passos à frente quando chegam no mercado de trabalho”.
Luiz Coelho, capitão da equipe e estudante do 6º semestre de Engenharia Mecânica, está na equipe há quatro anos, sendo responsável pela gestão interna dos 32 integrantes. Embora o projeto demande oficialmente 20 horas semanais dos envolvidos, Coelho destaca que a dedicação é muito maior: “Vivemos na oficina. Projetamos em casa. O tempo é nosso maior desafio, porque precisamos desenvolver um produto que envolve risco e precisa ser bem planejado”.
Cada carro tem um novo nome, resultado de um processo de naming baseado em conceitos como velocidade, agilidade e agressividade (princípios que definem a identidade da equipe). A estrutura interna é dividida em diretorias, como Powertrain, Dinâmica, Chassi, Elétrica, Aerodinâmica e Comunicação. Ainda assim, o trabalho é altamente colaborativo: qualquer mudança afeta o conjunto do carro e precisa ser validada coletivamente. O orçamento anual gira entre R$ 150 mil e R$ 170 mil, incluindo construção, transporte e estadia da equipe em São Paulo para participar da competição. A universidade oferece suporte, mas parte significativa do financiamento vem de parcerias buscadas pelos próprios alunos.
“Se fôssemos montar tudo do zero, o valor ultrapassaria R$ 250 mil. Para reduzir gastos, alguns itens são reaproveitados O atual motor está há três anos em uso, e o anterior durou oito. Um único jogo de pneus, por exemplo, custa cerca de R$ 20 mil”, relata o professor Hausen. No entanto, o impacto do projeto vai muito além da competição. Muitos dos avaliadores da Fórmula SAE são profissionais da indústria automotiva, que atuam como “olheiros” de talentos. “Alguns dos nossos alunos nem chegam a fazer estágio e saem da competição contratados”, afirma o professor Martins.
Apesar de resultados expressivos, os coordenadores ressaltam que muitos ainda não sabem da existência do projeto. “É impressionante como a universidade, às vezes, não se conhece”, observa Hausen. Com expectativa de retornarem vitoriosos de São Paulo, eles esperam que o desempenho na competição ajude a ampliar a visibilidade do Fórmula UFSM dentro e fora do campus.
Texto e Fotos: Maria Gotuzzo e Rafael Reis, bolsistas da Subdivisão de Divulgação e Editoração (PRE/UFSM).
Revisão: Valéria Luzardo, bolsista da Subdivisão de Divulgação e Editoração (PRE/UFSM).