Por Patrícia Milano Pérsigo (Professora Associada da UFSM, Doutora em Comunicação)
Na sociedade contemporânea, enfrentamos diariamente ameaças de diversas origens, sendo a sociedade de risco um dos principais conceitos para compreendê-las (Beck, 2010). Nesse contexto, a confiança e a credibilidade das fontes na comunicação de risco tornam-se essenciais para reduzir danos. Entretanto, nem todos os públicos têm acesso a tais informações, seja por baixo letramento, pela ausência de dispositivos de comunicação adequados ou pela falta de acessibilidade aos conteúdos. Diante disso, é fundamental um olhar atento para os públicos vulneráveis, como pessoas com deficiência, idosos e indivíduos com mobilidade reduzida.
A cultura do cuidado, aplicada à comunicação de risco, pode garantir uma inclusão equitativa de diferentes públicos, reduzindo impactos e prevenindo crises. De acordo com Michael Ashley Stein, professor e pesquisador da Harvard Law School, “pessoas com deficiência têm entre duas e quatro vezes mais probabilidades de morrer ou ficar feridas em emergências climáticas, incluindo ondas de calor, furacões e inundações”.
Com base nos estudos da psicologia moral, o cuidado se traduz na atenção e na dedicação ao outro (Oliveira, 2024). Dessa forma, compreendemos a cultura do cuidado como um elemento essencial para tornar a comunicação de risco mais inclusiva. Os riscos afetam indivíduos e, portanto, eles devem estar no centro desse processo, o que envolve atenção, diálogo ativo e busca genuína por conhecer esses públicos.
Em relação às pessoas com deficiência, é essencial adquirir conhecimento amplo sobre os tipos de deficiência que apresentam, sua localização na cidade, suas condições de habitação (se vivem sozinhas ou acompanhadas). Além disso, é fundamental entender como preferem receber as mensagens sobre riscos e quais membros dessas comunidades poderiam atuar como líderes na comunicação de risco. Essas questões contribuem para a construção de relacionamentos de confiança, visto que, na comunicação de risco, a credibilidade está vinculada à percepção de precisão, conhecimento e preocupação com o bem-estar público (Rangel, 2007, p. 1378).
Nesse contexto, organizações e governos devem atuar para que sejam reconhecidos como agentes de cuidado, comprometidos com seus diferentes públicos. A pesquisa da ONU para redução de riscos revelou que 86% das pessoas com deficiência entrevistadas não participaram da tomada de decisão local ou comunitária sobre planos de redução de riscos e desastres, embora 57% estivessem dispostas a se envolver nesses processos. Com base nesses dados, uma das recomendações da ONU (2023) é integrar abordagens centradas na pessoa e na comunidade para aprimorar a preparação de pessoas com deficiência.
O cuidado também se reflete na criação de oportunidades para a participação desses indivíduos na construção conjunta da comunicação de risco. Em um texto publicado no próprio OBCC, Rosângela Florczak destaca que “Comunicar, na perspectiva do cuidado, é manter um diálogo contínuo que investe na autonomia do ser humano, na corresponsabilidade e na capacidade de enfrentar e sobreviver às adversidades do tempo e da história, ou seja, às crises de todos os tipos e tamanhos. Comunicar deve se tornar, cada vez mais, sinônimo de cuidado”.
A perspectiva do cuidado na comunicação de risco para públicos vulneráveis vai além da promoção da acessibilidade. Trata-se de um compromisso com a inclusão efetiva e a corresponsabilidade social, fortalecendo redes de apoio e permitindo que indivíduos e comunidades enfrentem desafios com resiliência. Sob essa ótica, a comunicação de risco não deve ser apenas uma ferramenta técnica, mas um processo que incorpora a escuta ativa, a adaptação às necessidades diversas e a valorização da participação coletiva. Assim, ao incorporar a cultura do cuidado, a comunicação de risco se torna mais equitativa, promovendo não apenas a disseminação de alertas, mas também a construção de uma sociedade mais preparada e inclusiva.
Referências:
BECK, Ulrich. Sociedade de Risco: Rumo a uma outra modernidade. 2. Ed. São Paulo: 34, 2010.
RANGEL, Maria Lígia. Comunicação no controle de risco à saúde e segurança na sociedade contemporânea: uma abordagem interdisciplinar. Revista Ciência e Saúde Coletiva. 12 (5), 2007.
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