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UFSM reuniu estudantes indígenas da Região Sul



 

 

Abertura oficial do evento ocorreu na sexta-feira (26)

O 1º Encontro de Estudantes Indígenas da Região Sul aconteceu na última sexta-feira (26/8) e sábado (27/8), no prédio da Reitoria da UFSM. Contando com a participação de 80 pessoas, o evento foi realizado pelo Programa de Educação Tutorial (PET) Indígena, com o objetivo de discutir questões fundamentais como direito, território e saúde.

A abertura ocorreu na tarde de sexta-feira, com a presença do reitor, Paulo Afonso Burmann, do coordenador de Planejamento Acadêmico, Jerônimo Siqueira Tybusch, do professor tutor do PET Indígena, André Luis Ramos Soares, e de integrantes do PET Indígena.

Na primeira mesa-redonda, o tema foi “Direito: após 5 séculos de genocídio, extermínio, período integracionista e finalmente a constituinte de 1988, há realmente garantia de direitos aos povos originários?”, e teve como palestrantes o acadêmico de Direito da UFRGS Marcos Vesolosquzi e o advogado Julio Cesar Salles Ribeiro.

Ribeiro abordou a evolução dos direitos indígenas no país, desde 1910, com a criação do Serviço de Proteção ao Índio e Identificação dos Trabalhadores Nacionais (SPI), até a Constituição de 1988, que reconhecia apenas como terras indígenas as que eram habitadas naquela época – o chamado marco temporal. 

Segundo Ribeiro, o marco temporal é inconstitucional, pois viola o artigo 231, que prevê o direito originário a terra, além de que muitos dos territórios que antes eram habitados por indígenas foram invadidos. O advogado concluiu sua fala afirmando que a única solução é seguir lutando pelos seus direitos, e encerrou com a seguinte frase: “Para o homem índio, não resta outro caminho a não ser aquele que lhe liberta e liberta seu povo”.

Marcos Vesolosquzi destacou em sua fala as diversas dificuldades enfrentadas no Judiciário, no Legislativo e no Executivo. Com isso, Vesolosquzi incentivou o público a procurar entender os temas debatidos, participar e promover eventos, pois as expectativas não são boas e é preciso fazer frente aos desafios: “Hoje nosso papel é fundamental como protagonistas da causa indígena”.

No segundo dia, o tema da mesa-redonda da manhã foi “Território: passado, presente, futuro”. O antropólogo José Otávio Catafesto de Souza, professor da UFRGS, abordou o contexto histórico do capitalismo, da formação da sociedade e como isso influencia no processo de demarcação de territórios indígenas hoje. Além disso, abordou as chacinas que ocorreram na chegada dos europeus no país e as formas pelas quais os indígenas foram e vêm sendo tratados desde então.

Evento reuniu cerca de 80 participantesO representante do Conselho de Missão dos Povos Indígenas da região Norte do estado, Sandro Luckman, abordou a mobilização que tem sido feita pelos povos nos últimos anos e os encontros em Campo do Meio (MG) com estudantes e lideranças indígenas, que buscaram discutir, em conjunto com a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), não só sobre a terra, mas também sobre como remover a invisibilidade na luta pelo território. “A luta pela terra demarcada traz e expressa o quanto é difícil se fazer visível nessa sociedade, porque na lógica do não-índio, ceder o espaço territorial é também ter que reconhecer o indígena nesse espaço. A luta é dizer que estamos aqui, que pertencemos a esse lugar e temos esse direito”, afirmou.

À tarde, o representante da Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpinsul-RS), Francisco Runja Manoel Antônio, ressaltou que os estudantes devem aproveitar a formação acadêmica ao máximo para se tornarem mais preparados, e reafirmou a importância de os estudantes buscarem se mobilizar e se comprometer para que as próximas gerações tenham mais oportunidades.

Médica kaingang relatou sua trajetória

A última mesa-redonda teve como tema “Saúde: políticas de efetivação da saúde dos povos originários da Região Sul”, composta pela médica kaingang Lucíola Belfort e a enfermeira da Sesai Carmelinda Chaves Ribeiro. Lucíola contou sobre sua trajetória na vida acadêmica e profissional: entrou na faculdade de Enfermagem com 17 anos, em 1996, na Unijuí, na época a única do Rio Grande do Sul que tinha convênio com a Funai, que pagava as matrículas de Lucíola e mais três acadêmicos indígenas. A médica conta que muitas vezes passaram fome e necessidade, mas ao longo do tempo, eles conseguiram uma tutela vinda da Alemanha, que deu apoio com bolsas de estudo.

Em 2008, surgiram as políticas de inclusão, que facilitaram o acesso às universidades, e Lucíola conseguiu passar no vestibular de Medicina da UFRGS. Porém, sofreu ataques em redes sociais, com mensagens que contestavam sua capacidade e se era realmente indígena, uma vez que ela tem a pele mais clara e é mais alta que o comum para uma mulher indígena. Os acadêmicos recebiam bolsa, mas o dinheiro não era suficiente para custear as despesas. Resultado de muita luta, o Ministério da Educação (MEC) proporcionou que a bolsa subisse para um valor que contemplasse todas as necessidades dos acadêmicos e também concedeu o direito a participar de iniciações científicas, disciplinas complementares e a viajar para eventos acadêmicos, o que já era possível para os outros estudantes. Hoje, Lucíola atua como médica em Passo Fundo.

Para encerrar, Carmelinda fez uma fala de apoio e incentivo aos estudantes. Disse que é preciso fazer a diferença na universidade e no trabalho, enfrentar as dificuldades e vencer na vida. Após o fim da mesa-redonda, Marcos Vesolosquzi procedeu com a apresentação da sua pesquisa sobre o direito à saúde dos povos indígenas.

Segundo o professor tutor do PET Indígena, André Luis Ramos Soares, o evento foi completamente diferente de outros eventos acadêmicos porque não houve taxa de inscrição, o que facilitou a participação dos acadêmicos indígenas de outras universidades, mas foi necessário contar com o apoio da Pró-Reitoria de Graduação (Prograd), Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis (Prae) e Pró-Reitoria de Extensão (PRE) para passagens, refeições e hospedagem. Apesar das dificuldades, o evento foi inédito porque reuniu acadêmicos indígenas para discutir temáticas essenciais com palestrantes indígenas.

Os vídeos do evento estão disponíveis on-line no site www.farol.ufsm.br, sendo possível realizar o download, bastando clicar com o botão direito do mouse sobre cada vídeo e escolher a opção “Salvar vídeo como”. 

 

Texto e fotos: Gabriela Pagel, acadêmica de Jornalismo, bolsista da Agência de Notícias

Fonte: www.ufsm.br 

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