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A presença de corais favorece a ocorrência de peixes na costa brasileira

O estudo do projeto ReefSYN, liderado pela Profª. Mariana Bender da UFSM, mostra também que os peixes dos recifes brasileiros devem se adaptar melhor a um futuro com menos corais.



A pesquisadora Mariana Bender, professora do Departamento de Ecologia e Evolução do CCNE da UFSM, lidera um dos sete projetos do Centro de Síntese em Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (SinBiose) do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Trata-se do Projeto ReefSyn, composto por um grupo de pesquisadores em biologia marinha de instituições nacionais e internacionais focados em processar e compartilhar dados e resultados de sínteses da informação existente sobre a ecologia de recifes nacionais. Em outubro de 2022, Bender e seu time de pesquisadores publicaram um artigo na revista científica Scientific Report, do grupo Nature, uma das revistas de maior prestígio científico a nível mundial.

O artigo intitulado “Low functional vulnerability of fish assemblages to coral loss in Southwestern Atlantic marginal reefs”, que em sua tradução significa “Baixa vulnerabilidade funcional de assembleias de peixes à perda de corais em recifes marginais do Atlântico Sudoeste”, demonstra que, ao mesmo tempo que os corais aumentam a presença de peixes dos recifes na costa brasileira, a perda destes corais não parece comprometer o papel dos peixes na manutenção do ecossistema. Estes resultados contrastam com o que ocorre nos oceanos do Indo-Pacífico e Caribe, onde o declínio de corais frequentemente leva ao colapso geral de todo o ecossistema recifal. Assim, é possível que os peixes em recifes brasileiros consigam se adaptar melhor a um futuro com menos corais, que são extremamente sensíveis às mudanças climáticas.

Os recifes são estruturas formadas por esqueletos de invertebrados sobre as rochas das porções mais rasas dos oceanos. Estes ecossistemas ocupam apenas 0.000063% da superfície terrestre e abrigam pelo menos um quarto do conjunto da fauna e flora marinhas. Os corais são um dos organismos que ocupam os recifes de forma estrutural e chamam a atenção pela variedade de formas e cores. Entretanto, devido à pesca, poluição e às mudanças climáticas, estas espécies estão em declínio globalmente. Estima-se que 14% dos corais do mundo desapareceram entre 2009 e 2018, o que representa cerca de 11.700 km².

“Os recifes de coral no Brasil são considerados ‘marginais’ para o desenvolvimento da maior parte das espécies de corais. Como aqui as águas são turvas, há menos luz penetrando na coluna d’água e uma menor diversidade e cobertura de espécies de corais nos recifes quando a comparamos com a diversidade e cobertura encontradas em recifes do Indo-Pacífico e do Caribe”, explica Mariana Bender, da Universidade Federal de Santa Maria, coordenadora do ReefSYN e autora do estudo. Nos recifes brasileiros a cobertura predominante é de algas.

Mesmo não sendo muito abundantes, os corais do litoral brasileiro favorecem a ocorrência de peixes e assim ajudam a aumentar a diversidade de peixes recifais.  “As colônias de corais oferecem muitos recursos para os peixes recifais, como abrigo e alimentação. Por isso, cerca de 40% das espécies de  peixes analisadas, de um total de 113 espécies, têm maior probabilidade de ocorrer em locais com maior abundância de corais. Desta forma, a ocorrência dos corais beneficia as populações de peixes recifais”, explica André Luza, primeiro autor do estudo e pesquisador de pós-doutorado do ReefSYN.

Coral Millepora. Fonte: Ronaldo Francini-Filho.
Os corais são espécies-chave para a manutenção da biodiversidade nos recifes brasileiros. O coral representado nesta foto é o coral Millepora. Foto: Ronaldo Francini-Filho.

No caso brasileiro, este papel dos corais se torna ainda mais interessante por serem importantes mesmo sendo pouco abundantes, em contraste às algas que são muito comuns porém não aumentaram tanto quanto os corais a chance de ocorrência de peixes no modelo deste estudo. “Este resultado demonstra que os corais são espécies chave para a manutenção da biodiversidade nos recifes brasileiros, mesmo não sendo dominantes como são nos recifes do Caribe e do IndoPacífico”, conclui Guilherme Longo, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e último autor deste trabalho.

Para chegar aos resultados, os pesquisadores fizeram modelagens computacionais a partir da observação de peixes recifais em 36 pontos distribuídos ao longo dos 8000 km de litoral brasileiro. A coleta de dados consistiu na instalação de câmeras de vídeo e fotográficas cobrindo dois metros quadrados em vários sítios de coleta, resultando em aproximadamente 4.000 horas de filmagem. “Foram inúmeras câmeras para registrar a atividade dos peixes nos recifes. Com isso, foi possível registar e associar a atividade dos peixes sobre os organismos fixos no fundo do mar, em uma escala bem fina”, explica Bender. Este esforço de coleta foi possível graças a parceria com o projeto SisBiota Mar (CNPq).

Segundo os autores, os peixes recifais brasileiros provavelmente manterão boa parte das funções ecológicas que realizam, apesar dos declínios de corais induzidos pelo clima e consequente perda de peixes associados a corais.

“É importante destacar que não removemos experimentalmente os corais para identificar outros efeitos sistêmicos. Fizemos uma simulação computacional”, adverte Bender. Por exemplo, não se sabe quais os impactos em cascata com a retirada de espécies deste ecossistema – o que os cientistas chamam de extinção secundária – ou ainda, se a sobrepesca já afetou as funções ecológicas dos peixes recifais. “Extinções podem já ter ocorrido, e o que podemos estar vendo atualmente é um conjunto depauperado de peixes e invertebrados”, conjectura Luza. Outro ponto é que os modelos focam na probabilidade de ocorrência e não consideram impactos sobre abundância, sobrevivência ou reprodução destes organismos. “A conclusão de que os corais favorecem a ocorrência de peixes utilizando essa abordagem de modelo em larga escala espacial é um primeiro passo. Agora precisamos avançar com estudos experimentais para entender os mecanismos dessa relação entre peixes e corais”, projeta Longo.

Pautadas as limitações do estudo, estes resultados ainda são positivos para, por exemplo, planejar as melhores estratégias de conservação de recifes brasileiros focadas em refúgios climáticos, ou seja, na priorização de ambientes capazes de se adaptar às mudanças do clima. “Não se trata de entender que os corais não são importantes para o ecossistema recifal brasileiro. Ao contrário, a cobertura de coral potencialmente suporta populações de peixes recifais maiores e recifes com mais espécies de peixes. Isto confere maior capacidade dos ecossistemas recifais manterem a sua estrutura e função quando expostos a perturbações”, finaliza Bender.

 

Sobre o Projeto ReefSYN

O projeto ReefSYN – Recifes Brasileiros no Antropoceno: estimando os impactos da perda da biodiversidade sobre o funcionamento e serviços ecossistêmicos para aperfeiçoar o manejo futuro e a subsistência, está vinculado ao Centro de Síntese em Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos – SinBiose do CNPq, tem como objetivo integrar dados da biodiversidade dos recifes brasileiros para responder questões sobre padrões de diversidade, mudanças climáticas, e serviços ecossistêmicos. O ReefSYN busca mapear as funções e os serviços oferecidos por recifes às populações humanas costeiras, e contribuir para o manejo e conservação dos ecossistemas recifais brasileiros. Para tal, o projeto reúne uma equipe de especialistas em diferentes áreas do conhecimento, e é desenvolvido em uma atmosfera colaborativa, de ciência aberta e reprodutível.   

 

Texto: Paula Drummond, assessora do Centro de Sìntese em Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (SinBiose) do CNPq.
Edição: Natália Huber da Silva, chefe da Subdivisão de Comunicação do CCNE.

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