Precariedade em moradia e saneamento básico é um dos os maiores desafios no enfrentamento da pandemia no Brasil
Durante a pandemia causada pelo novo coronavírus, o Observatório de Dados da COVID-19 da UFSM tem reunido esforços de diferentes setores da universidade no fornecimento de informações sobre a evolução e distribuição territorial dos casos no Rio Grande do Sul. Entre os colaboradores está o Núcleo de Pesquisa em Geografia da Saúde (NePeGS). O Núcleo mapeou os locais do município de Santa Maria em condições precárias e mais suscetíveis à proliferação do vírus, reunindo informações estratégicas para que o poder público possa combater a pandemia em um contexto de desigualdade social.
A função do Núcleo no Observatório é georreferenciar, geocodificar e especializar dados sobre casos confirmados, suspeitos e descartados, além de fornecer um mapa que mostre demonstre as localizações de casos no território. Outras informações são agregadas e fornecidas à vigilância epidemiológica para que ela possa desenvolver estratégias para conter a difusão espacial, como, por exemplo, a existência de casos em uma área de ocupação irregular, ou entre a população indígena.
O Núcleo leva em consideração as particularidades de cada cidade e região, pois a forma como a COVID-19 se comporta depende das condições de saneamento, habitação e infraestrutura, além de outros aspectos, como extensão territorial. A variação de comportamento pode ser diferente em áreas do mesmo bairro. Segundo o professor Rivaldo Faria, fundador e coordenador do NePeGS, o Brasil possui profunda desigualdade social e quando uma doença se instala em uma cidade como Santa Maria, é efetivamente tão ou mais grave conforme as desigualdades territoriais.
O grupo desenvolveu um mapeamento da pobreza em Santa Maria, que conclui que entre 30% a 35% da população do município vive em situação extremamente precária em relação a habitação, saneamento e infraestrutura, distribuídos em bairros ao norte, oeste, sul e algumas áreas de Camobi. Porém a maior concentração de população em situação de vulnerabilidade está ao longo do Arroio Cadena, da ferrovia e ao redor do Morro Cechella.
De acordo com Faria, o enfrentamento em locais com essas condições é mais difícil por diversos aspectos, como por exemplo, a impossibilidade de realizar distanciamento social em casas com muitos moradores. Outro mapeamento realizado foi o da população idosa de Santa Maria, o maior grupo de risco à COVID-19, assim como a população que possui alguma doença crônica, pois condições precárias das casas destas pessoas é um fator extremamente perigoso.
Geografia da Saúde é estratégica nas ações de combate à pandemia
Criado em 2017 para entender como os fenômenos da doença e da morte se expressam geograficamente no território, o Núcleo de Pesquisa em Geografia da Saúde é o único no estado do Rio Grande do Sul especializado no tema. Atualmente, conta com um grupo significativo de doutorandos, mestrandos e alunos de graduação, que atuam tanto na pesquisa científica quanto em projetos de extensão.
Segundo o professor Rivaldo Faria, a Geografia da Saúde é essencial porque a COVID-19, além de um problema médico, biológico e econômico, é também um evento geográfico, desde a contaminação – que depende de uma coincidência espacial entre uma superfície ou pessoa infectada e a pessoa que será infectada – à difusão, visto que começou na China e se tornou uma pandemia.
No Brasil, a doença seguiu um roteiro geográfico, chegando primeiro às capitais, onde estão os maiores núcleos populacionais e fluxos de pessoas mais intensos. Após, se espalhou na rede urbana e para cidades próximas, se estendendo para as cidades médias e chegando então aos pequenos municípios. Como ainda não há tratamento ou vacina, a técnica utilizada é também geográfica: no isolamento social, a população de uma área evita o contato social para reduzir o número de pessoas infectadas.
Além disso, a partir da aplicação da geografia da epidemiologia e da geografia social, é realizado o monitoramento dos equipamentos médicos. É necessário saber se o número de leitos, médicos e ambulâncias é suficiente para a demanda, baseada no número de casos de coronavírus. Caso a equação demonstre que os equipamentos médicos serão insuficientes durante o durante o pico de contaminação da doença, os gestores devem atuar para evitar incapacidade de atendimento.
Reportagem: Ana Laura Iwai, bolsista da Agência de Notícias da UFSM
Edição: Davi Pereira
Fotografia: Bibiana Pinheiro