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UFSM é contemplada com bolsas de estudo voltadas a estudantes negros

O Grupo Carrefour é o responsável pelo financiamento das bolsas, como forma de reparar o crime de racismo ocorrido em uma das filiais da empresa em 2020



Na véspera do Dia da Consciência Negra de 2020, João Alberto Silveira, um homem preto, foi espancado até a morte pelos seguranças de uma unidade do supermercado Carrefour, no estacionamento do local, em Porto Alegre. O crime teria ocorrido por conta de um suposto incidente com a vítima no mercado, o que mais tarde se esclareceu como mais um caso de racismo. Como uma das medidas estabelecidas pela Justiça de reparação da violência, a empresa está investindo R$ 68 milhões em bolsas de estudo em instituições federais de todo o país, incluindo na UFSM, para 883 brasileiros negros terem a oportunidade de se manter no meio acadêmico com menos dificuldade.

A determinação, que corresponde ao Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado com o Ministério Público e a Defensoria Pública, tem como finalidade reparar o dano causado pelo violador do direito em questão. Nesse sentido, a UFSM, uma das universidades contempladas pelas bolsas de estudo, publicou um edital para selecionar os estudantes que receberão a assistência.

Ainda que não solucione o problema racial como um todo, as bolsas vão colaborar para que a discrepância entre a quantidade de pessoas brancas e pretas no ensino superior siga diminuindo. Isso porque, de acordo com pesquisa feita pelo site Quero Bolsa, com dados do IBGE, entre 2010 e 2019, o número de estudantes pretos no ensino superior subiu 400%. Contudo, apesar disso, negros representam, atualmente, apenas 38,15% do total de universitários no Brasil, enquanto seu percentual no total da população é de 56%. Por isso, toda ação que busque equalizar tais números é necessária, especialmente em cursos com o histórico de baixa representatividade da população negra. Considerando isso, a UFSM distribuirá suas bolsas entre os seguintes cursos:

  • Graduação em Administração diurno – Campus Santa Maria: um estudante – Valor mensal da bolsa: R$ 1 mil;
  • Graduação em Comunicação Social – Produção Editorial: um estudante – Valor mensal da bolsa: R$ 1 mil;
  • Graduação em Engenharia Civil: um estudante – Valor mensal da bolsa: R$ 1 mil;
  • Graduação em Engenharia Química: um estudante – Valor mensal da bolsa: R$ mil;
  • Pós-Graduação em Educação – Mestrado: dois estudantes – Valor mensal da bolsa: R$ 3.5 mil.
  • Pós-Graduação em História – Mestrado: um estudante – Valor mensal da bolsa: R$ 3.5 mil.

Especificações para os bolsistas

As inscrições já se encerraram. O resultado definitivo dos selecionados deve ser publicado na sexta-feira (14). Para ser selecionado como bolsista, o acadêmico deve ser negro; estar matriculado entre o primeiro e o penúltimo ano dos cursos citados anteriormente; não possuir bolsas da Capes, CNPq, Fapergs, FNDE ou Finep; não ocupar cargo ou emprego público, ou estar a vinculado a qualquer empresa que realize, ou possa realizar, auditorias e atividades de fiscalização no Grupo Carrefour; ter cursado o ensino médio em escola pública ou em escola privada com bolsa de estudo integral; ser oriunda de família com renda igual ou inferior a 1,5 salário mínimo per capita; dentre outras especificações listadas no edital.

Ao dispor da assistência, o aluno receberá a bolsa mensalmente até a conclusão do curso, mas para isso precisa concluí-lo no prazo recomendado pela UFSM, não ser reprovado em nenhuma disciplina e obedecer a frequência mínima da sua graduação.

Essa responsabilização é o suficiente?

É importante ressaltar que a existência do edital decorre de um assassinato cruel, então, logicamente, nenhuma medida jamais será capaz de amenizar a perda da família de João Alberto, conforme comenta o professor coordenador do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Neabi) da UFSM, Anderson dos Santos. Todavia, ele destaca a necessidade de haver a responsabilização pelo crime, e reforça que ela só aconteceu por meio de um conjunto de lutas do movimento negro, que se iniciaram no Rio Grande do Sul e, posteriormente, se expandiram para o restante do país, desde que o crime ocorreu. Em soma a esse pensamento, o militante do Movimento Negro Unificado (MNU) e professor integrante do Neabi Lazie Lopes salienta a relevância da conquista das bolsas de estudo. ’Quando se trata de casos que repercutem por conta do racismo estrutural, torna-se difícil algum tipo de responsabilização. O caso Carrefour é um marco neste sentido, para que sociedade e as empresas entendam que o racismo não pode ser tolerado e as empresas são corresponsáveis pelo que acontece em seus espaços”, afirma. 

Porém, partindo para um cenário mais amplo, Lopes acredita que o investimento em bolsas de permanência em todos os âmbitos de ensino seja fundamental, tanto por parte de grandes empresas como por parte do Estado. Aliado a isso, todos os casos de racismo precisam começar a ter seus responsáveis devidamente punidos, senão esse tipo de crime seguirá se repetindo. Ao encontro disso, Anderson dos Santos defende que companhias como o Carrefour mudem sua postura, reconhecendo o racismo que praticam, aplicando políticas de ações afirmativas para que pessoas negras sejam contratadas não apenas em cargos mais baixos, mas também em áreas de coordenação. 

Olhando para dentro da UFSM

Embora a UFSM seja reconhecida por sua política de permanência estudantil e de ações afirmativas, o coordenador do Neabi observa ainda a fragilidade com que a Instituição, bem como as demais universidades federais, tem para lidar com seus próprios casos de racismo, o que provém da invisibilização do tema ao longo das décadas no Brasil. 

Para que a Universidade fosse contemplada no edital, o NEABI, juntamente ao Observatório de Direitos Humanos, esteve a frente das tratativas para que os cursos e programas de pós-graduação participassem e aderissem ao edital. No entanto, Anderson ainda avalia que a adesão foi baixa e considera que tais iniciativas ainda precisam de maior incentivo Institucional para que possam ser mais abrangentes e beneficiar mais estudantes negros e negras.

Felizmente, este cenário tem, aos poucos, se alterado, mas, para que esse processo se efetive mais rapidamente, o professor afirma que as políticas de promoção da equidade racial devem ser reforçadas. E isso não somente nas formas de ingresso e permanência na Universidade, mas também ‘’no reconhecimento dos notórios saberes negros e indígenas, na curricularização das disciplinas voltadas para as relações étnico-raciais, e nas políticas de extensão e pesquisa”. Em complemento, o militante do MNU reitera a importância de se coibir casos de racismo dentro da UFSM, pois somente com isso e com as ações de políticas afirmativas a Instituição alcançará o objetivo de ‘’formar profissionais do presente para o futuro’’.

Texto: Laurent Keller, acadêmica de jornalismo e bolsista da Agência de Notícias
Edição: Ricardo Bonfanti, jornalista 

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