
Os urros dos bugios não passam despercebidos. São sons graves e potentes que preenchem o ambiente e podem ser ouvidos a quilômetros de distância. Esse ronco marcante revela a presença dos primatas em diferentes locais, até em perímetros urbanos.
Os bugios são macacos do gênero Alouatta, encontrados em diversas regiões do Brasil. Eles variam de tamanho médio a grande, com pelagens ruivas ou pretas, dependendo da espécie. Sua alimentação é composta principalmente por flores, frutos e folhas.
Na sexta-feira (14), um bugio da espécie Alouatta guariba caiu na rede elétrica da Subestação Santa Maria 3, no Distrito Industrial. O acidente exigiu o desligamento temporário da energia na cidade. Após o resgate, o Zoológico São Braz prestou cuidados ao animal, que estava em coma e com graves queimaduras. O bugio não resistiu aos ferimentos e faleceu quatro dias após o incidente.
Os sentinelas
O Ministério da Saúde considera os bugios como “sentinelas” da presença do vírus amarílico. Quando esses primatas contraem o vírus da febre amarela, a maioria não sobrevive, funcionando como indicadores ambientais da circulação viral.
Um projeto de extensão do curso de Ciências Biológicas da UFSM Palmeira das Missões carrega o mesmo nome. O “Projeto Sentinela: etnobiologia e educação ambiental para a conservação dos bugios e de seu habitat” tem como principal objetivo contribuir para a conservação da fauna e da flora das localidades abrangidas, em especial os bugios, através da disseminação de conhecimento científico e da conscientização da população.
Em 2008 e 2009, o Rio Grande do Sul registrou um surto de febre amarela que afetou fortemente a população de bugios. Além das mortes causadas pelo vírus, muitos animais foram vítimas de violência motivada pela crença equivocada de que transmitiam a doença aos humanos. Diante desse cenário, o Projeto Sentinela foi criado em 2012. “Em Santa Maria, onde já tínhamos estudos de ecologia e comportamento dos bugios, percebemos uma grande diminuição da população. Em função disso, começamos a organizar o Projeto Sentinela”, relembra a coordenadora do projeto, Vanessa Barbisan Fortes, do departamento de Zootecnia e Ciências Biológicas da UFSM.
O grupo recebeu capacitação do Centro Estadual de Vigilância em Saúde (CEVS) e passou a realizar capturas monitoradas de bugios para coleta de sangue e busca de anticorpos contra a febre amarela. Com o tempo, o projeto ampliou suas ações, atendendo a outras demandas relacionadas aos bugios.
Os bugios na cidade

Atualmente, os registros de bugios em perímetros urbanos de Santa Maria têm aumentado. Nos últimos anos, dois casos de eletrocussão foram oficialmente identificados, mas conflitos com a população são recorrentes. “Uma das questões que têm se tornado mais relevante ultimamente é o monitoramento do aparecimento de bugios em regiões periféricas da cidade. Isso acontece porque estamos tendo uma urbanização acelerada, bastante intensa e que, às vezes, transforma o habitat dos animais. Temos bugios em praticamente todo o entorno de Santa Maria”, explica Vanessa.
O projeto também recebe solicitações de resgate e translocação de animais.
“Às vezes existe algum conflito ou motivo para que o animal não permaneça em determinada área. Avaliamos a situação e, se for o melhor para o animal, colaboramos com os órgãos ambientais para realizar a translocação”, complementa a coordenadora.
Além disso, o Sentinela realiza o monitoramento ativo da saúde dos primatas, verificando se apresentam doenças ou outras ameaças.
Ameaças aos bugios
Segundo Vanessa, as fortes chuvas de maio de 2024 também afetaram a população de bugios. Em parceria com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e o Centro de Primatas Brasileiros, o projeto avalia especialmente a situação dos animais na região da Quarta Colônia. “Em um primeiro momento, os resultados parciais mostram que os bandos de bugios estão menores, com menos indivíduos do que antes das inundações, talvez porque tenham sobrado menos recursos para eles nas florestas. Muitas florestas foram bastante impactadas, teve muita queda de árvores”, aponta a coordenadora.
A principal ameaça, atualmente, ao bem estar dos bugios é a urbanização desenfreada. Segundo Vanessa, a urbanização destrói o habitat e desmata áreas de convivência desses animais. Por isso, cada vez mais bugios podem ser vistos em áreas periféricas.
O projeto trabalha para mapear os animais que são vistos em áreas urbanas. “O que mais tem nos ocupado é o monitoramento do impacto das inundações sobre os bugios, o mapeamento dos bugios na zona urbana e as intercorrências que tem acontecido com os bugios. Registramos esses incidentes para tentar fazer um diagnóstico de como melhorar o ambiente urbano para que se torne mais amigável para esses animais que têm aparecido mais pela cidade”, conta Vanessa.
O que devo fazer se encontrar um bugio perto da minha casa?

A presença dos animais na região urbana exige a conscientização da população. Caso um bugio seja encontrado na cidade, o primeiro passo é não estressá-lo: evitar chegar perto ou passar a mão. Se o animal estiver machucado, não é indicado que cidadãos sem experiência tentem cuidar deles.
Os bugios não transmitem febre amarela e, em seu habitat natural, não costumam representar ameaça aos humanos. Porém, quando se sentem ameaçados, podem morder. Por isso, é essencial manter distância e acionar os órgãos responsáveis. “Se ele está em perigo mais iminente, em que seja preciso fazer um resgate, o ideal é que o animal, para ser capturado, seja sedado por um órgão responsável para evitar um estresse desnecessário para o bicho”, explica Vanessa.
Assim, se um bugio for visto no perímetro urbano, identifique se ele está correndo risco. Olhe ao redor e veja se há fiações que podem dar choque, se eles podem sofrer atropelamento ou se há cachorros que podem atacar. Se essas possibilidades são reais, entre em contato com a Polícia Militar ou com os Bombeiros. Se não houver risco iminente, mantenha distância e deixe que o bugio encontre seu caminho naturalmente, sem que haja estresses.
Se encontrar um bugio machucado, o primeiro passo é entrar em contato com o órgão que pode realizar o resgate. Mantenha o local que o bugio está seguro, mas não se aproxime e aguarde as pessoas responsáveis chegarem.
A partir de dezembro de 2025, a UFSM poderá receber casos emergenciais de animais feridos no Centro de Triagem de Animais Silvestres (CETAS), em parceria com o Ibama. O Hospital Veterinária da UFSM também recebe animais silvestres feridos.
Contatos:
- Projeto Sentinela: ProjetoSentinelaUFSM no Facebook ou @projeto.sentinela_ufsm no Instagram;
- Comando Regional de Polícia Ostensiva Central: 55 3226- 8895
- Guarda Civil: (55) 3174-1552 ou 153
- Patrulha Ambiental: (55) 98442 2872
- Secretaria de Município de Meio Ambiente: (55) 3174-1543
As denúncias podem ser feitas pelo site da Prefeitura de Santa Maria. Para isso:
- Entre no link: https://www.santamaria.rs.gov.br/ ;
- Olhe na parte superior esquerda e clique em “Secretarias”;
- Clique na “Secretaria de Município de Meio Ambiente”;
- Então, olhe nos espaços abaixo do nome da secretaria e clique em “Controle e Bem- Estar Animal”;
- Você terá o acesso á meios de contato: email e telefone
- Ou você pode clicar no link do formulário para denúncia e adicionar as informações necessárias;
Texto: Jessica Mocellin, acadêmica de Jornalismo e bolsista da Agência de Notícias
Fotografias: Arquivo do Projeto Sentinela
Edição: Mariana Henriques