Conferir se os discursos e promessas dos políticos que postulam ao pleito municipal deste ano têm procedência e se sustentam é desejo de todos nós eleitores. Entretanto, checar essas informações não é uma tarefa fácil. Esta é a proposta do estudante de jornalismo William Boessio que, depois de descobrir o método conhecido como fact-checking, decidiu acompanhar as declarações dos candidatos à prefeitura de Santa Maria e conferir se os discursos proferidos são verdadeiros ou não.
O método conhecido como fact-checking foi inaugurado em 1991 pelo jornalista Brooks Jackson. Naquele ano, a pedido da empresa CNN, Jackson ficou encarregado de produzir uma reportagem analisando a veracidade das propagandas televisivas veiculadas durante as prévias da eleição presidencial nos Estados Unidos. Entretanto, apenas no ano de 2003, a Factcheck.org, primeira organização especializada na checagem de fatos, foi fundada. Trata-se de um projeto da Annenberg Public Policy Center, da Universidade da Pensilvânia nos Estados Unidos, que inspirou outras instituições focadas no método a desenvolverem suas agências.
Na América Latina, a pioneira foi a organização argentina Chequeado, responsável por impulsionar países como Chile, Uruguai e Brasil a fundarem agências especializadas no Fact-checking. Para Laura Zommer, diretora executiva da organização Chequeado, em uma declaração para o e-book ‘El boom del fact checking en América Latina – Aprendizajes y desafíos del caso de Chequeado’, a missão do Fact Checking é: “verificar o discurso público para fortalecer a democracia, aumentar a prestação de contas e fortalecer a cidadania”.
A descoberta do método de checagem pelo estudante de jornalismo William Boessio foi impulsionada pela vontade de produzir algo inusitado em seu trabalho de conclusão de curso. Em um mapeamento inicial feito pelo estudante, o que chamou a atenção foi o número cada vez maior de iniciativas que utilizavam a checagem de dados para produzir informações. A ideia, então, foi iniciar um projeto experimental para investigar os discursos políticos de candidatos a prefeito de Santa Maria.
O primeiro passo foi gravar entrevistas e debates em programas de TV e rádio, além de propagandas veiculadas no horário eleitoral. O passo seguinte foi selecionar conteúdos sobre temas principais, como: segurança, saúde, educação, mobilidade urbana e outros que ganhassem destaque durante a campanha. Foi só no dia 21 deste mês, depois de toda a apuração do material, que as checagens começaram a acontecer.
Com o auxílio de mais quatro estudantes do curso de Jornalismo- Gabriele Wagner, Iander Moreira, Luan Romero e Mayara Souto- a equipe analisou as falas dos candidatos e iniciou as pesquisas procurando dados que comprovassem ou não seus discursos. Porém, essa não foi uma tarefa fácil. Boessio explica que nem sempre os candidatos são objetivos em suas manifestações:
– Fizemos uma seleção daquilo que pudesse ser ‘checável’, que não era a promessa, mas o dado utilizado durante a promessa – explica o estudante. E explica ainda que, quando a equipe não encontrava informações que confirmassem ou refutassem as falas, perguntas eram enviadas para os candidatos para que estes tivessem, assim, a possibilidade de explicar o que foi dito.
Com a análise concluída, o discurso recebe uma classificação que indica sua veracidade ou não. Cumpridos esses passos, os resultados são publicados.
Um novo paradigma do jornalismo?
Lucas Durr Missau morou dois anos em Buenos Aires (AR), onde estava fazendo doutorado. Foi lá, através de uma oficina desenvolvida pela organização Chequeado, que teve o primeiro contato com o método de checagem de dados. Logo que voltou para o Brasil, a vontade foi aplicar os conhecimentos adquiridos e, com o auxílio dos alunos que integram o Laboratório de Experimentação em Jornalismo (LEX), criar um método de checagem que, depois, pudesse ser usado em outras iniciativas relacionadas às atividades do Laboratório. Missau conheceu o trabalho realizado pelo estudante William Boessio e passou, junto com a equipe do LEX, a dar suporte ao projeto do estudante.
Para Lucas, o método utilizado no fact checking não é algo novo, pois parte de um dos princípios do jornalismo, que é apuração. Entretanto, define a checagem como um novo modelo de formato de conteúdo e de negócios, já que criou uma nova formatação visual ao conteúdo, além de incentivar agências a montarem estruturas de empresas baseadas em verificação detalhada dos discursos públicos.
O projeto experimental realizado por Boessio é orientado pela professora Viviane Borelli e, segundo ela, além de prestar um serviço à sociedade, o fact-checking reafirma valores da profissão do jornalismo. “É um modo diferente de fazer jornalismo, mas que chama atenção para algo que estava perdido: apuração, checagem e rechecagem”.
Viviane acredita que o papel social do método está justamente na proposta de analisar o discurso, comprovando o papel do jornalismo de certificar para depois informar. O estudante William Boessio considera que, para os jornalistas envolvidos com a checagem, um dos pensamentos centrais é o da vigilância, já que o objetivo é acompanhar o discurso dos políticos a fim de que eles pensem duas vezes antes de dizer uma informação para a população.
Divulgação dos resultados das checagens
Seguindo orientações do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul e da Procuradoria Jurídica da Universidade Federal de Santa Maria, o resultado das checagens será divulgado na página do Lex somente a partir do término do pleito eleitoral com o objetivo de atender ao interesse público e não interferir no resultado das eleições. Dessa maneira, a publicação do conteúdo foi organizada em dois períodos: o primeiro, após o resultado do primeiro turno das eleições, quando serão divulgadas as análises referentes aos candidatos que não seguem em disputa eleitoral no segundo turno; o segundo, depois da confirmação dos resultados do segundo turno das eleições municipais em questão.
Para ler as checagens, acesse o site do LEX. Nesta segunda-feira (3), foram divulgados os primeiros discursos checados.