Embora possa ser encontrada no mundo todo, a bactéria Bacillus thuringiensis leva o nome de um
dos locais onde foi identificada pela primeira vez, a região da Turíngia, na
Alemanha, no início do século 20. Descobriu-se que esse microrganismo produz
proteínas que têm efeitos tóxicos em insetos e, desde meados daquele século, a
bactéria serve para a produção de inseticidas, principalmente para uso na
agricultura. Mais recentemente, organismos geneticamente modificados têm sido
produzidos com genes dessa bactéria. Sempre que, no rótulo de um produto alimentício,
se encontram as letras Bt, quer dizer que se trata de alimento feito com grãos
nos quais foi introduzido material genético de Bacillus thuringiensis. Uma nova frente de pesquisa com esse bacilo
tende a beneficiar o ser humano mais diretamente, pois descobriu-se que a sua
toxicidade não atinge somente os insetos, mas também células neoplásicas
(cancerígenas).
O Professor Roberto Christ Vianna Santos, do Departamento de
Microbiologia e Parasitologia da UFSM, viaja nesta semana para o México para participar
do projeto “Síntese, caracterização e estabilidade de nanopartículas contendo
parasporinas de Bacillus thuringiensis
e sua avaliação como agentes antineoplásicos” (Síntesis, Caracterización y estabilidad de nanopartículas conteniendo
parasporinas de Bacillus thuringiensis y su evaluación como agentes
antineoplásicos), o qual é realizado em parceria com a Universidad del
Papaloapan (Unpa) e Universidad Nacional Autónoma de México (Unam). Também
participarão pesquisadores do Programa de Pós-Graduação em Nanociências do
Centro Universitário Franciscano (Unifra).
Os preparativos para a pesquisa começaram em 2015, quando o
professor Miguel Angel Peña-Rico, da Unpa, entrou em contato com professor Roberto
Christ, que o conhecia da época quando realizou pós-doutorado
baseia-se em uma tese de doutorado defendida na Unpa por Alain Cruz-Nolasco, a
qual tinha como tema o isolamento e identificação de cepas de Bacillus thuringiensis produtoras de
proteínas com atividade biológica.
Como foram obtidos resultados positivos no combate a células
cancerígenas, um projeto de pesquisa mais abrangente foi aprovado pelo Consejo
Nacional de Ciencia y Tecnología (Conacyt), órgão de fomento do governo
mexicano, que está investindo no trabalho aproximadamente 1,5 milhão de pesos –
o equivalente a cerca de R$ 260 mil. A coordenadora do projeto, cujo
encerramento está previsto para 2018, é a professora Ana Karin Navarro Martinez,
da Unpa.
Quanto à cepa de bactérias coletada no México, foi
comprovada não só a sua ação antimicrobiana e inseticida, como também a ação
antineoplásica em diferentes tipos de células cancerígenas humanas.
Posteriormente, esse material será enviado até Santa Maria, para o
desenvolvimento das nanopartículas de parasporinas (como essas proteínas são
conhecidas entre a comunidade científica). Elas serão ainda caracterizadas e avaliadas
quanto à estabilidade.
Em todo o mundo, as pesquisas para o tratamento do câncer
com base em Bacillus thuringiensis
ainda estão em estágio inicial. Portanto, ainda é muito cedo para apostar nele como
a nova “cura” da doença. Esse tratamento seria, teoricamente, menos
agressivo ao organismo do paciente do que as intervenções convencionais, como a
quimioterapia e a radioterapia. Mas também existe o risco de que as proteínas
produzidas tenham efeitos indesejáveis sobre células saudáveis.
Outro empecilho para o uso em larga escala dessa bactéria no
tratamento do câncer é a instabilidade das parasporinas, pois sua frágil
estrutura pode se deteriorar dependendo do ambiente em que são armazenadas.
Isso dificulta também a sua produção em larga escala.
Tendo em vista uma maior estabilidade desse material, a
equipe da Unifra, coordenada pelas professoras Michele Sagrillo e Aline
Ourique, vai testar o seu transporte através de nanoestruturas conhecidas como
lipossomas, que são vesículas esféricas formadas por camadas de fosfolipídios.
O estado atual e as perspectivas futuras das pesquisas serão
debatidos no México, durante a 5ª Reunião de Materiais, Nanotecnologia e
Ciências Aplicadas, que acontece de
a 8 de dezembro na cidade de San Juan Bautista Tuxtepec,
no estado de Oaxaca. O professor Roberto Christ será um dos palestrantes da
reunião, fazendo a conferência de abertura do evento, e também realizará treinamento
teórico e prático nas instituições locais. O evento também terá a participação
de pesquisadores da Unifra. Em 2018, será a vez dos pesquisadores mexicanos
virem a Santa Maria para conferir in loco
o estágio do trabalho desenvolvido aqui. Neste estudo, estão envolvidos – além
dos professores já mencionados – alunos de mestrado e doutorado dos programas
de pós-graduação
Ciências Farmacêuticas da UFSM e Nanociências da Unifra.
Texto: Lucas Casali