
Pelo segundo ano consecutivo, a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) sediou, no sábado (11) e no domingo (12), a 2ª edição dos Jogos Universitários Indígenas da Região Sul (Juirs). Realizado nas dependências do Centro de Educação Física e Desporto (CEFD), o evento reuniu aproximadamente 400 participantes, entre lideranças, parlamentares e atletas representantes de comunidades indígenas do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná.
Os Jogos Universitários Indígenas da Região Sul são organizados pela Comissão Indígena da UFSM, com apoio da Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis (PRAE), Pró-Reitoria de Extensão (PRE), Gabinete do Reitor, SEDUFSM, Observatório de Direitos Humanos (ODH) e Federação Universitária Gaúcha de Esportes (FUGE). O lema da edição de 2025, “Esporte como Resistência”, sintetiza o propósito do evento em transformar o espaço acadêmico em um território de ancestralidade e celebração coletiva.
A UFSM sagrou-se campeã geral pela segunda vez consecutiva. Além da UFSM, as seguintes instituições participaram da competição: Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) – Campus de Chapecó, Erechim e Realeza, Universidade Federal do Pampa (Unipampa), Universidade Federal do Rio Grande (Furg), Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). As comunidades indígenas Guarita, Kaingang e Guarani também integraram os Jogos.
Estiveram presentes na cerimônia de abertura: a vice-reitora da UFSM, Martha Adaime; a pró-reitora de Assuntos Estudantis, Gisele Guimarães; a pró-reitora adjunta de Assuntos Estudantis, Cassiana Marques; o diretor do CEFD, Rosalvo Sawitzki, além de Luiz Bonetti, representando o Diretório Central dos Estudantes (DCE). Também participaram o deputado federal Marcon, a ex-deputada federal Reginete Bispo e o representante do deputado estadual Valdeci Oliveira, Daniel Diniz.
A pró-reitora de Assuntos Estudantis, Gisele Guimarães, enfatizou o papel das políticas afirmativas e o protagonismo dos estudantes indígenas: “A gente nem consegue mais lembrar o que era a UFSM sem vocês. [Esses jogos demonstram a materialidade da assertividade das políticas afirmativas dentro das universidades. Ver vocês organizados em um evento bonito, colorido e diverso é a certeza de que estamos no caminho certo”, disse.
A vice-reitora Martha Adaime complementou: “É lição de acolhimento, é lição de conjunto, de coletivo, de estar juntos. Dizer a vocês que a palavra é gratidão por todos os ensinamentos que vocês têm nos trazido”.

Modalidades disputadas e arbitragem
Os Juirs envolveram tanto modalidades tradicionais quanto esportivas contemporâneas. Foram disputadas as seguintes provas: arco e flecha; bodoque; corrida do maracá ; corrida com tora; corrida dos 100m; luta corporal; arremesso de lança; arremesso de peso; cabo de guerra; vôlei misto e futsal. Algumas modalidades, inclusive, foram arbitradas por acadêmicos do curso de Educação Física da UFSM.
“Esse convívio é um espaço de aprendizagem significativo. Os nossos alunos estão envolvidos com os jogos, organizando, arbitrando. E nós estamos aprendendo com isso”, destacou o diretor do CEFD, Rosalvo Sawitski, quanto à contribuição dos Jogos Universitários Indígenas ao Centro.
Entre os nomes de destaque das competições de atletismo, Maira Andressa Amaral, da Terra Indígena do Guarita e acadêmica da Unipampa, conquistou o primeiro lugar nos 100 metros rasos feminino. “Ano passado eu não consegui participar porque eu já estava lesionada no joelho. Aí eu tive que me cuidar pra poder participar esse ano, tanto que eu já não praticava tanto esporte assim”, relata Maira. Ela ainda conta que a corrida não é o seu esporte favorito, prefere usar os pés para jogar bola: futsal, futebol e futebol sete, e que não esperava sagrar-se campeã nos 100m: “Não, isso não, eu estava mais pela participação mesmo, mas hoje dei sorte”.
Na categoria masculina, um dos corredores foi Renã Cardoso, da UFFS – Campus Erechim. Ele acabou não conseguindo integrar o pódio, mas afirma que os Juirs representam muito mais do que apenas disputas esportivas: “Para mim são muito importantes, dá uma grande visibilidade para nós indígenas, né? Porque esses jogos aqui não é só por diversão, nem por medalha, nem nada. É para mostrar a nossa cultura e também o que representa para a gente”.
Estrutura e acolhimento
Diferente do ano passado, foram disponibilizados para as delegações indígenas os ginásios 3 e 4 do CEFD, como área de descanso. Parte dos participantes, porém, optou por montar acampamentos ao ar livre, uma escolha que também representa o vínculo cultural com a natureza. “A questão do acampamento fora também é um costume do movimento indígena. É uma coisa bem comum, a maioria do pessoal prefere ficar fora dos ambientes fechados para estar mais em contato com a natureza, que é de onde a gente vem”, explicou o acadêmico de Enfermagem Leonardo Kaingang, um dos organizadores e idealizadores dos Juirs.
O Restaurante Universitário (RU) proporcionou refeições comunitárias aos participantes, com cardápio escolhido pelos organizadores, composto por peixe, mandioca, arroz, feijão preto, alface e tomate. “O pessoal do RU foi extremamente solícito. Eles deram essa opção pra nós, porque a gente tem uma alimentação totalmente diferente da que é servida aqui. Escolhemos o peixe frito, que é uma das melhores proteínas, e espero que todas as delegações gostem”, confessa Leonardo.

Noite cultural e etnomídia
Além das modalidades esportivas, os Jogos Universitários Indígenas da Região Sul também contaram com uma noite cultural, realizada na noite do sábado (11). Dentre as performances culturais, o povo Tikuna, do campus da UFFS de Realeza (PR), realizou uma apresentação cultural, e DJs indígenas de outras universidades, como a UFPEL, também integraram a programação. “A noite cultural é o momento de maior descontração. Também tem a escolha da mais bela atleta e também a premiação”, explica Leonardo Kaingang.
Os Juirs também dispuseram de uma cobertura audiovisual realizada sob uma perspectiva indígena. O projeto Caipora – Etnomídia Indígena, desenvolvido na UFSM, acompanhou o evento com o intuito de registrar e comunicar a experiência dos jogos a partir da ótica dos próprios povos originários. “A gente tem cobrido os jogos nessa edição porque a Caipora é um projeto de etnomídia indígena, então o objetivo é que a gente consiga ajudar os parentes nos Jogos, trazendo uma perspectiva da mídia de forma étnica também, a partir da nossa cosmovisão”, explica o estudante de Direito e comunicador indígena Xainã Pitaguary, integrante da Caipora, quanto ao papel do grupo.
Ele ressalta também a importância de registrar o evento como uma forma de afirmação e memória coletiva: “Os Jogos são um dos espaços mais importantes de eventos da UFSM. Nesse último período eu acho que tem uma importância muito grande, além do momento que a gente está vivendo de reafirmação da presença indígena na universidade. E trazer essa cobertura a partir do nosso viés, da nossa ótica, em um espaço que a gente possa controlar absolutamente, mas também que a gente possa registrar. É um espaço de eternizar esse lugar em uma rede própria, do próprio movimento indígena.”

Legado e futuro
As competições e apresentações foram permeadas pela presença de crianças indígenas, que brincavam entre as quadras e arquibancadas, acompanhando as delegações. Leonardo comenta a importância de inserir o público infantil desde cedo em organizações como os Jogos Universitários Indígenas da Região Sul: “Os Jogos são para essas crianças que estão brincando aqui. Que coisa linda ontem ver dentro do ginásio as crianças brincando, correndo, se divertindo. Os Jogos foram pensados dessa maneira: deixarmos um legado para nossas crianças, para que elas continuem o que nós estamos traçando hoje dentro das universidades”.
Leonardo também destaca que o movimento já se articula para ampliar o projeto para nível nacional. A ideia é que no ano que vem, ainda, o evento migre para outra universidade e que na edição seguinte, passe a rodar o Brasil. “Já estamos em negociação. Em 2027 ou 2028 estamos programando os Jogos Universitários Indígenas Nacionais”, revela o idealizador do Juirs.
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Texto: Marina Brignol, acadêmica de Jornalismo, bolsista da Agência de Notícias
Fotos: Paulo Barauna, acadêmico de Desenho Industrial, bolsista da Agência de Notícias
Edição: Ricardo Bonfanti